Abril Azul: mãe de criança autista fala sobre os desafios e a rotina

Abril Azul: mãe de criança autista fala sobre os desafios e a rotina

Nome completo: Claudineia Aparecida Vitor Ferreira

Idade: 36 anos

Naturalidade: Guaxupé/MG

Formação acadêmica: Enfermagem e Assistência Social

Profissão: Educadora Social

 

Noticiantes: Como percebeu que sua filha poderia ter autismo?

Claudineia: Eu percebi que a minha filha poderia ter autismo por volta de um ano e meio de idade. Com alguns sintomas iniciais que ela já apresentava como, choro constante, ela não olhava fixamente para gente, ela apresentou epilepsia como no autismo tem algumas comorbidades que vem junto, ele nunca vem sozinho, alergia a proteína do leite, alguns distúrbios gastrointestinais.

Eu busquei ajuda já de início, quando eu estava na cidade de Guaxupé, quando retornei de São Paulo, vim para cá ter ela pois não tinha familiares em São Paulo. Eu tentei buscar tratamento para ela aqui na cidade, porém, não consegui, foi quando decidir retornar para São Paulo, para procurar o tratamento adequado.

Entrei na USP para trabalhar na enfermagem, no HC, e consegui ter um convênio suficiente para começar a investigação do que ela poderia apresentar além da epilepsia e da proteína do leite que ela já apresentava.

Ela começou a andar nas pontinhas do pé, teve atraso na fala e já agendei de início um neuropediatra para ela na USP, foi quando a neuropediatra com especialização em autismo fechou o diagnóstico dela com 2 anos e meio e a gente já começou a fazer o tratamento que é a base de terapias com uma equipe multidisciplinar.

Noticiantes: Como foi receber o diagnóstico de que sua filha é autista?

Claudineia: Foi um choque de início porque eu não sabia que havia pessoas na família do meu esposo que tem. Mesmo sendo uma profissional da saúde e mesmo tendo uma suspeita do caso a gente assusta no início, mas, foi um alívio pois queria descobrir o que a minha filha tinha.

Eu ouvi de muitos médicos que eu tinha bobeiras na cabeça, que eu era louca, que eu tava pensando que a minha filha era doente, a gente ouve muitas bobeiras no início quando a gente está em busca do desconhecido. Infelizmente, a gente encontra profissionais no caminho que não são preparados e nem tem experiência suficiente.

A gente tem que procurar o especialista adequado para não perder tempo. A médica que fez o diagnóstico disse na época que a minha filha estava com um atraso comportamental gigantesco, só que eu já estava procurando tratamento para ela há muito tempo, mas só pediam eletros por conta das convulsões e falavam que não tinha mais nada, que ela era epiléptica e não tinha o que fazer. Mas, no fundo eu sabia que tinha alguma coisa a mais e além das convulsões. 

Noticiantes: O que mudou na sua vida após o diagnóstico do autismo? Quais desafios e cuidados especiais que você precisa ter com seu filho?

Claudineia: Mudou muito a minha vida e do meu esposo porque nós dois fomos embora, porque a gente começou a levar ela para as terapias, esportes, eu decidi juntamente com a equipe médica buscar bastante tratamento e os médicos decidiram fazer testes genéticos com ela, por conta das epilepsias, porque as convulsões delas são diferenciadas e o geneticista que eu acompanho com ela observou algumas características que poderia ter alguma síndrome envolvida nisso e graças a Deus, hoje, existe um exame chamado exoma, ele é coletado no Brasil, mas ele é analisado nos Estados Unidos e a minha filha fez esse exame onde veio constando uma síndrome raríssima que está sendo estudada nos Estados Unidos, ela tem uma troca de uma letra no DNA que o um dos sintomas dessa síndrome é o autismo e veio confirmando que foi herança genética.

Noticiantes: Como é a rotina do seu filho? Frequenta alguma escola especial?

Claudineia: Mudou totalmente a nossa rotina do dia a dia. A gente teve que se adaptar a ela, porque infelizmente hoje a nossa vida de trabalho, a nossa rotina para uma criança atípica é bem complexa, é bem complicado porque a gente tem que adequar a eles e não eles se adequarem a gente.

Noticiantes: Você e seu filho já passaram por alguma situação de preconceito ou discriminação? Conte-nos.

Claudineia: Já sofremos várias discriminações porque hoje as pessoas estão com o hábito de colocar o autismo de nível 1, 2 e 3 mas só quem vive com uma criança autista sabe que a criança pode está em um nível de suporte 1 de manhã e a noite está em um nível de suporte 3, ela pode sair de um nível para o outro muito rápido pelas crises. A gente já sofreu muito preconceito porque as pessoas tem a mania de falar ‘ah não tem cara de autista’, aí fala que é falta de colocar limite ou nas filas preferências eu sempre levo minha filha com o crachá dela, com o cordão de identificação, e mesmo assim a gente sofre como se o nosso filho não tivesse nada porque não tem aparência.

Noticiantes: Como é ser mãe atípica?

Claudineia: Ser mãe atípica, eu acredito muito que seja um dom de Deus porque tem que ter uma paciência, um amor incondicional e uma garra gigantesca além da força que a mãe já tem, porque a gente sofre muito. Tem dias que de madrugada a gente tá chorando, tá abalada pelo dia cansativo que foi com o filho, em relação a terapias, a escola.

Hoje, se fala muito de autismo só que a inclusão no meu ponto de vista como mãe e como profissional, é lindo, maravilhoso no papel, na teoria, mas na prática não funciona. Porque, hoje muitas escolas não tem os professores auxiliares que necessitam está ali presente para acompanhamento da criança, para evolução da criança, infelizmente, muitas escolas colocam estagiários, colocam cuidadores e não é para ser assim. É muito triste saber que a inclusão é maravilhosamente linda no papel e não funciona na prática.

Você vai pegar um ônibus, você sofre preconceito. Você está no táxi, sofre preconceito. Você precisa de uma van escola, você sofre preconceito. Você precisa de uma escola, sofre preconceito. No papel, para fazer caminhada, postagens muitas pessoas fazem, mas para aderir ao tratamento que a criança autista necessita não tem apoio, infelizmente.

Noticiantes: Em Guaxupé, você acredita que existem políticas públicas eficientes para acolher os autistas?

Claudinia: Eu voltei para a cidade tem um mês, trabalhei na época da pandemia, estava com estresse muito alto, então voltei para descansar. Eu acredito na instituição da Apae e coloco muitas fichas. É a única instituição que tem os profissionais adequados e que precisam, mas está com uma demanda muito alta para pouco profissional que tem, porque não tem profissional para trabalhar, não estão conseguindo encontrar.

As crianças estão com necessidade de fonoaudiólogo e terapia ocupacional e a Apae está precisando desse apoio. Não tem na rede do SUS, psiquiatra infantil, não tem terapeuta ocupacional. Eu acredito muito no trabalho da Apae e eles precisam muito de apoio.

Noticiantes: Você enfrenta dificuldades na cidade para encontrar apoio, serviços públicos que seu filho necessita?

Claudineia: Realmente, a gente encontra dificuldades na cidade em relação a inclusão. Precisa de professor com especialização em inclusão e todas as crianças não tem. A minha filha precisa de uma professora adjunta com especialização em inclusão. É complicado porque não oferece isso para as crianças.

As crianças estão basicamente, no meu ponto de vista, elas estão colocadas para serem contadas apenas como números das escolas. E na saúde também, porque está faltando profissionais. Eu gostaria de estar fazendo um apelo para as autoridades para poder estar revendo isso, para essa inclusão tão linda do papel que ela realmente seja colocada em política pública, para estar dando suporte não só para criança, mas também para essas famílias, porque sobrecarrega muito. E a gente ouve de profissionais que tem mães que estão atrás de benefícios, que tem mães que não quer trabalhar, escola liga para mãe buscar filho mais cedo, locais onde a criança fica no contraturno ligam para buscar as crianças mais cedo, então que inclusão que é essa que não tem profissionais adequados onde os pais necessitam deixar as crianças e onde é o lugar de direito de a criança estar?

Noticiantes: O Noticiantes agradece sua participação e deixa o espaço aberto para as considerações finais.

Claudineia: Eu como mãe atípica faço um apelo. Que política pública seja voltada para a inclusão verdadeira, com olhar de empatia, de amor. Não adianta nada ter tanta postagem, as famílias que não tem dentro de casa, julgam as famílias que tem, sem ao menos tentar ajudar de alguma forma. Esse apelo meu é para os vereadores, os administradores terem essa visão e apoiar as únicas instituições que estão dispostas a fazer o trabalho de ajudar essas mães como a gente merece, como as nossas crianças merecem. Eu deixo o meu muito obrigado para o Jornal Noticiantes pelo convite. Tenho fé que um dia as nossas crianças serão inclusas, realmente, na sociedade com uma inclusão verdadeira.