A fábula da tartaruga e o escorpião
Certo dia, estava o escorpião à beira de um rio, chateado, cabisbaixo. A tartaruga se aproximou e, solidária, perguntou-lhe: – O que há, escorpião, por que tanta tristeza? – É que eu queria atravessar o rio, mas não sei nadar – respondeu. A tartaruga generosa, disse: – Ora, suba aí nas minhas costas que eu te levo. Mas, prometa-me uma coisa: não vá me ferroar. – Prometo, claro que prometo – disse ele. No meio da travessia, o escorpião cravou seu ferrão mortal no pescoço indefeso da tartaruga que gritou: – Mas, o que você foi fazer? Agora morreremos os dois. Eu envenenada e você afogado. – Desculpe-me, tartaruga, eu não queria, mas você sabe como é… É da minha índole, minha natureza. Eu sou assim. Moral da história: Quem tem índole ruim, cedo ou tarde acaba mostrando o que realmente é.
Antigamente, antes do Cristianismo, já existia a Lei do “olho por olho, dente por dente”, conhecida como Lei de Talião, "talião" vem do latim "talis" (tal) que significa "idêntico" ou "semelhante". (Hamurabi, rei da Babilônia, no século XVIII a.C., é o autor de 282 leis, que ficaram conhecidas como Código de Hamurabi, baseadas na lei de talião, pena antiga pela qual se vingava o delito, o mesmo dano ou mal que ele praticava. Olho por olho, dente por dente, era a base de qualquer justiça: "Se uma pessoa arrombar uma casa alheia, deverá ser condenado à morte e ser enterrado na parte da frente do local do arrombamento". "Se alguém acusa o outro, mas não pode prová-lo, o acusador será morto". Isto é, se alguém lhe faz o mal, dê o troco em igual ou pior medida. Era uma lei tribal, para defender a tribo e os que faziam parte. O diferente era visto como inimigo, mesmo sendo da mesma espécie. A proposta era combater a violência com outro ato de violência. Nós sabemos que violência por violência gera mais violência. Jesus apresenta uma proposta inovadora que é Combater a Violência com a não violência. A solução está no amor e no perdão. A proposta agora de Jesus é amar o inimigo, aqueles que nos perseguem, que nos prejudicaram ou querem prejudicar. Enquanto o mundo nos ensina que temos que vingar aqueles que nos prejudicou com maldade, Jesus manda fazer o contrário, perdoá-los, e sobretudo amá-los. Não é a violência da vingança que irá recuperar aquele que errou, mas o amor.
“A maldade crescerá a tal ponto no mundo que o amor se esfriará no coração de muitas pessoas. Mas aquele que perseverar até o fim, esse será salvo” (Mt 24,12-13). Essas palavras de Jesus, além de retratarem muito bem a época em que estamos vivendo, nos alertam para o perigo de nos tornarmos duros de coração, ou seja, pessoas que não apenas desistiram de amar, de crer na bondade do ser humano, mas também desistiram de perdoar, pois parece que a única coisa que o perdão faz é alimentar a sensação de impunidade.
Ao falar sobre a necessidade do perdão, Jesus não está defendendo de forma alguma a impunidade, mas nos tornando conscientes de que, na história de todos nós, o perdão foi, é e sempre será necessário. Não há ser humano que nunca cometa algum erro, ou que, ao longo da vida, nunca prejudique ou machuque alguém, intencionalmente ou não. Portanto, não há ser humano que não necessite ser perdoado.
O perdão que recebemos de Deus na cruz de seu Filho (cf. Ef 1,7; Cl 1,20) nos fez um imenso bem: curou as nossas feridas. Mas, enquanto o perdão cura, a falta de perdão adoece, como nos ensina o Eclesiástico: “Se alguém guarda raiva contra o outro, como poderá pedir a Deus a cura?” (28,3). Aqui é importante nos darmos conta de que o autor bíblico afirmou que quando sentimos raiva, adoecemos; nós adoecemos quando guardamos raiva, ou seja, quando, todos os dias, alimentamos sentimento de raiva em relação à pessoa que nos prejudicou ou nos ofendeu. É impossível não sentirmos raiva de alguém que peca contra nós. A raiva é uma defesa natural, para nos proteger da pessoa que nos agride. Porém, quando decidimos prender a pessoa na nossa raiva, ela não sai mais de nós, e aquela presença venenosa nos adoece. Como se diz: “Guardar ressentimento é como tomar veneno e esperar que a outra pessoa morra” (autor desconhecido).
Ainda a respeito do perdão, o Eclesiástico nos aconselha: “Lembra-te do teu fim e deixa de odiar” (28,6). Nossa vida terrena é muito curta para ser estragada pelo ressentimento da raiva, da mágoa ou do ódio. Essa importância exagerada que damos à ferida que o outro abriu em nós é totalmente enorme à duração da nossa vida neste mundo. A vida é curta demais para vivermos em função de mágoas em relação ao passado. Por isso, o melhor que temos a fazer é perdoar, para que nossa vida volte a fluir, para que possamos dormir melhor e termos saúde física, psíquica e espiritual.
Para nos mostrar o quanto a nossa decisão em não perdoar a pessoa que nos feriu é insensata, Jesus faz a comparação entre dois tipos de dívidas ou de prejuízos: uma enorme e outra insignificante. O homem que devia uma quantia enorme teve sua dívida perdoada, justamente porque não tinha como pagá-la! No entanto, esse mesmo homem decidiu não perdoar a dívida insignificante que seu amigo tinha para com ele, jogando-o na prisão “até que pagasse o que devia” (Mt 18,30). A dívida impagável são os nossos pecados, perdoados por Deus; a dívida insignificante são as ofensas do nosso próximo, ofensas que nos recusamos a perdoar. Para quem acha que tem toda razão em não perdoar, o Evangelho faz um alerta: essa pessoa será entregue aos torturadores, até que pague toda a sua dívida (Mt 18,34). Portanto, quando eu decido não perdoar, entrego-me aos torturadores: sou torturado diariamente pelo ódio, pela mágoa, pelo ressentimento, pelo rancor, pela não aceitação do que me aconteceu.
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