JESUS REALMENTE QUIS UMA IGREJA?

JESUS REALMENTE QUIS UMA IGREJA?

         A Igreja celebra nesta Solenidade de São Pedro e São Paulo o dia do Papa. São Pedro e São Paulo, os dois pilares da Igreja, de forma diferentes e complementares.

 Pedro, recebeu o nome de pedra, generoso e ao mesmo tempo frágil, chegou a negar o Mestre e, após a ressurreição, teve confirmada a missão de apascentar o rebanho de Cristo. Pregou o evangelho e deu seu último testemunho em Roma, onde foi crucificado de cabeça para baixo sob o imperador Nero.

        Paulo não fez parte do grupo dos doze, mas foi chamado por Jesus. Paulo não conhecia Jesus segundo a carne, foi perseguidor dos cristãos. Foi sacudido pelo próprio Jesus no caminho de Damasco, e pela força e poder de Deus foi perdoado, e transformado de inimigo dos cristãos, ao melhor e maior missionário de Reino de Deus. Jesus o fez apóstolo. Foi preso e decapitado em Roma, sob o imperador Nero. As palavras de Paulo servem para Pedro: “Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé”. Ambos foram perseverantes na missão: e não desanimaram no caminho. Pedro disse: “Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que te amo”, Paulo exclamou “para mim, viver é Cristo”.

Nos últimos quarenta anos, muitos católicos se afastaram da nossa Igreja, de modo que se tornou muito comum a expressão “católico não praticante”. Pesquisas recentes também detectaram que entre os evangélicos, muitos se afastaram de suas igrejas, de modo que o número de “evangélicos não praticantes” não para de crescer. Portanto, seja do lado católico, seja do lado evangélico, a “religião” que mais cresce hoje no Brasil é a dos “sem igreja”, e o principal motivo é o desencanto. Além da falta de coerência de muitos líderes religiosos – não vivem aquilo que pregam –, muitos católicos sentem a Igreja distante de sua vida concreta, enquanto que muitos evangélicos se escandalizam com a manipulação do Evangelho em vista do enriquecimento pessoal dos seus líderes.

É verdade que o individualismo e o relativismo atuais contribuem muito para a vivência de uma fé “self service” (sou cristão “do meu jeito”). No entanto, é inegável que os pecados da instituição Igreja tem uma séria parcela de responsabilidade no descrédito de muitas pessoas em relação ao próprio Deus ou ao Evangelho de Jesus Cristo. Sobretudo no âmbito católico, o outro lado da moeda dos “católicos não praticantes” é o fato de que a ação pastoral da nossa Igreja ainda é de “manutenção” e não de atuação missionária. A pergunta a ser feita não é: “Por que muitas pessoas não vêm à Igreja?”, mas “Por que a Igreja, na sua ação pastoral, insiste em se manter distante da vida concreta da maioria das pessoas?

Jesus conferiu a Pedro, o primeiro Papa, uma missão específica: “Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus” (Mt 16,19). Muitas pessoas decidiram se desligar da Igreja por causa das suas imperfeições humanas. Nossa missão é ser uma chave que abre a porta e dá acesso ao sagrado. Nossa missão é ligar as pessoas a Deus, consiste em ajudar a humanidade a se desligar daquilo que a adoece e destrói e ligar-se àquilo que cura a vida e salvação. 

O Papa Francisco insiste que a nossa Igreja deve ser sempre uma “Igreja em saída”: Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças” (EG 49). Cabe a cada um de nós, católicos, fazer da nossa Igreja “um hospital de campanha após a batalha” (Papa Francisco, setembro de 2013), uma Igreja dedicada em cuidar das feridas de seus fiéis e sempre disposta a sair para encontrar os que foram machucados, excluídos ou que se afastaram. Se nós, católicos, não estamos dispostos a ser uma presença de cura, um Evangelho vivo para aqueles que estão fora da nossa Igreja, não há razão alguma para continuarmos a nos identificar como católicos.   

Quem as nossas crianças ou os nossos jovens têm como referência hoje? Quem é a sua referência de pai e mãe, de líder político e religioso? Quem é sua referência no campo da fé? Quem é sua referência de pessoa, de ser humano? Existe hoje um vazio quando falamos de referência. Jesus foi uma referência viva para Pedro e para Paulo, como o próprio Paulo testemunhou: “Sei em quem depositei a minha fé” (2Tm 1,12). Assim como esses apóstolos, nós precisamos ter Jesus como nossa referência de vida, num mundo onde a perda de referência deixa as pessoas cada vez mais desorientadas e frágeis.

Jesus perguntou aos discípulos o que as pessoas diziam sobre ele. Quem é Jesus? Na medida que descubro quem é Jesus eu me engajo na comunidade. Hoje escutamos muita gente dizer que ama Jesus, mas não ama a Igreja? Cristo e Igreja são inseparáveis. O que acontece é que não queremos compromisso com Cristo e com a Igreja.

Hoje como as pessoas vivem sua fé? Hoje a fé é vivida a partir do individualismo: Deus, sim; Igreja, não. Fé, sim; religião, não. Nada de vínculo com uma igreja; nada de compromisso com as necessidades pastorais da Igreja.

A geração de hoje rejeita raízes porque não admite ficar “agarrada” a Igreja: A geração quer seguir pela vida como uma folha livremente levada pelo vento. Mas aqui se esconde uma contradição: a mesma pessoa que não admite ser “conduzida” pela instituição a Igreja, aceita ser “conduzida”, para não dizer “arrastada”, pelo vento das circunstâncias do momento. O resultado é o que estamos vendo hoje: pessoas fragilizadas, desorientadas, sem referência, que facilmente tombam diante de qualquer vento que lhes sopre contrário.

          Outra questão preocupante em nosso mundo moderno é aversão ao sofrimento, a rejeição a qualquer tipo de dor, a repulsa a toda experiência de cruz. E tudo isso por causa da sociedade do bem-estar em que vivemos, para a qual a vida só tem sentido se você estiver vencendo, se você estiver do lado dos fortes, distante de todo tipo de fracasso, blindado contra a tristeza e a dor que afetam inúmeras outras pessoas. O problema é que essa cultura do bem-estar, nos torna frágeis diante da vida. Um dos motivos do aumento do suicídio está aqui: a não aceitação da dor como parte da condição humana de qualquer pessoa. Jesus tinha um sonho, um ideal, um propósito: salvar a humanidade. E ele também estava consciente de que, para alcançar esse propósito, deveria enfrentar a realidade da cruz. Ora, quem tem consciência do valor do seu sonho, jamais desiste dele só porque encontra obstáculos no caminho para alcançá-lo.