Prefeitura de Bariri corta insalubridade dos agentes comunitários pela metade após proposta de 40% ser aprovada na Câmara Municipal; “nos sentimos traídos”, diz agente

Prefeitura de Bariri corta insalubridade dos agentes comunitários pela metade após proposta de 40% ser aprovada na Câmara Municipal; “nos sentimos traídos”, diz agente
Agentes compareceram à sessão legislativa que aprovou a proposta por unanimidade em julho

No dia 18 de julho, a Câmara Municipal de Bariri aprovou por unanimidade o projeto de Lei Complementar nº 04/2022, que altera o piso salarial dos agentes comunitários de saúde e agentes de combate a endemias. Membros da categoria marcaram presença em peso no plenário e acompanharam a leitura e votação da matéria.

O texto instituiu a mudança salarial de R$ 1.821,07 para R$ 2.449,14, e a insalubridade de R$ 728,43 para R$ 969,60, ou seja, 40% de insalubridade sobre o salário base. Ao final da sessão, os agentes presentes na Casa de Leis entoaram uma salva de palmas e posaram para fotos junto com os vereadores.

No entanto, um mês depois da sessão, a categoria foi convocada na quarta-feira (17) para uma reunião com representantes do Poder Executivo. Na oportunidade, foi anunciada uma alteração no projeto já aprovado: o cálculo da insalubridade seria reduzido para 20% sobre o salário base.  Ou seja, de R$ 969,60 (conforme descrito na proposta aprovada pelos vereadores), o valor da insalubridade caiu pela metade (R$ 484,80).

Insatisfeita com a decisão do prefeito Abelardo Maurício Martins Simões Filho (MDB), a categoria recorreu à imprensa. Nossa reportagem recebeu o relato de uma agente comunitária que preferiu não se identificar, mas comentou com detalhes todo o caso.

“Tudo começou porque teve uma votação em Brasília, onde se fixou o novo valor do piso dos agentes em dois salários mínimos. Esse valor vem integral do Governo Federal e apenas nos repassam, não onerou a prefeitura em nada. A insalubridade já é por conta da prefeitura, quinquênio e outros adicionais. Quando o projeto foi lido na Câmara, leram valores referentes a 40% de insalubridade do salário base dos agentes de saúde e endemias, e foi aprovado por unanimidade. Agora, voltaram atrás e disseram que esse valor que foi lido na Câmara e aprovado não tem valor de lei, o que não é verdade”, começou a agente.

Segundo ela, a reunião convocada pela prefeitura contou com um representante de cada posto de saúde. No pleito, ficou determinado que os agentes terão que devolver a insalubridade referente a dois meses, referentes as folhas salariais junho e julho. A prefeitura deu a opção de o valor ser devolvido em 6 parcelas. Para o mês de agosto, a insalubridade já foi alterada para 20% no holerite.

“Todos os agentes estão se sentindo traídos e enganados. No dia que teve a sessão na Câmara, fomos lá participar; eles leram o valor referente a 40%. O valor da parcela pra gente devolver ficou alto, em torno de R$ 160,00 a parcela. Reclamamos que é um valor alto para devolver, já que o erro foi deles. Todos nós estamos bem revoltados. Eles falaram que o que foi lido na Câmara era apenas uma apresentação, não a lei. Tentamos ligar na prefeitura para falar com o prefeito, mas ele não recebeu a gente. Dá a impressão que fizemos papel de tontos lá na Câmara, pois todo mundo lá entendeu que seria 40%. Foi uma sacanagem; procuramos nossos direitos e os advogados estão tomando medidas cabíveis. Quem fez conta contando com esse dinheiro, se apertou. Não temos como aceitar isso”, desabafou a servidora.   

 

Em reunião com agentes, Executivo justifica fim da pandemia e invalida mensagem do prefeito Abelardinho anexada ao Projeto de Lei

Ainda segundo a agente de saúde, na reunião promovida pela Prefeitura Municipal de Bariri junto aos agentes comunitários, representantes do governo Abelardinho justificaram que a pandemia terminou em abril. Com isso, todos os profissionais da saúde teriam que voltar a receber 20% de insalubridade.

“Falaram pra gente que, depois de abril, o prefeito deu mais 30 dias para todos se adequarem. Então, em maio recebemos a insalubridade inteira (40%) e junho e julho disseram que era para termos recebido só 20%. Por isso, eles vão descontar junho e julho. Só que na sessão da Câmara foi lido o valor referente a 40%. Os advogados que acionamos disseram que vão lutar pelos 40% e que a devolução é ilegal”, completou a agente.

Uma outra justificativa apontada pela administração alega que o que realmente vale é o Projeto de Lei, não a mensagem anexada a ele. Geralmente, todos os projetos de lei do Executivo encaminhados para apreciação dos vereadores acompanham um documento anexado assinado pelo prefeito Abelardo Maurício Martins Simões Filho, a chamada mensagem, que é lida na íntegra antes da votação.

No caso do projeto que alterou o salário dos agentes, a mensagem nº 44/2022 dizia: “(...) o salário base dos empregados passará da referência 129 (R$ 1.821,07) para a referência 141 (R$ 2.449,14) e a insalubridade de R$ 728,43 para R$ 969,60”. Todos os vereadores, imprensa, agentes comunitários e demais pessoas que acompanharam a sessão legislativa, presencialmente e de forma on-line, ouviram a leitura da mensagem assinada por Abelardinho. O documento também está disponível para consulta no site da Câmara de Bariri.

Já no texto do Projeto de Lei nº 04/2022 não há valores. A matéria afirma: “Fica alterada a referência dos empregos públicos de Agente Comunitário de Saúde e Agente de Combate a Endemias, contidos na Lei Municipal nº 3.309, de 2002, e alterações posteriores, passando da referência 129 para a referência 141”. Com isso, a prefeitura alega que a mensagem não teria valor, tendo que seguir apenas o que ficou estabelecido no projeto.

“Na reunião, eles falaram que a mensagem não tem valor nenhum, que serve apenas para os vereadores entenderem do que se tratava o assunto. Quando rebatíamos, eles retrucavam a gente. Ficamos sem ação, sem saber o que falar”, finaliza a agente.

 

O que dizem os vereadores?

Nossa reportagem entrou em contato com os vereadores da Câmara Municipal de Bariri, uma vez que o projeto de lei que alterou a folha salarial e a insalubridade dos agentes comunitários foi aprovado por unanimidade no Legislativo. Confira abaixo o posicionamento dos parlamentares:

 

“Considero que o erro cometido é inadmissível.  A mensagem que acompanha o projeto deve ser um resumo fiel do mesmo, jamais apresentando dados que não estejam contemplados no projeto que ela, a mensagem, acompanha. Que erros como esse não se repitam.” – Airton Pegoraro (MDB)

 

“Acredito que houve uma falha muito grande do Poder Executivo nesse caso, que não fez uma avaliação aprofundada da questão em relação aos direitos à insalubridade dos Agentes de Saúde. Explico: concedeu o direito à insalubridade nas atividades, no percentual máximo de 40% e, depois, retrocedeu ao percentual em grau médio de 20%, alegando que houve um equívoco na análise do nível de insalubridade das atividades das ACSs. Aconselho, nesse momento, que as ACSs façam a interpelação judicial, para que a Justiça do Trabalho faça a avaliação através de Perito Judicial das suas atividades, para verificar qual o real nível de insalubridade em que se classificam as atividades exercidas. Somente dessa maneira, através de uma Perícia Judicial imparcial é que se poderá saber se terão ou não o direito ao grau máximo da insalubridade.” – Ricardo Prearo (PDT)

 

“O tema da insalubridade dos servidores da Saúde foi levantado por mim através do requerimento nº 56/2022, justamente por entender que a pandemia ainda não acabou oficialmente pelo Ministério da Saúde nem pela OMS, levando em consideração também o grande número de funcionários que foram acometidos pela doença no ambiente de trabalho. Ficando muitas vezes com sequelas irreversíveis que comprometem o seu bom desempenho, necessitando, portanto, de um amparo nos seus vencimentos. Por conta disso, fiz a indicação para que o Poder Executivo forneça a todos os servidores da saúde municipal um abono que possa cobrir a diferença originada pelo abatimento de 20% da insalubridade. O projeto do Executivo que normalizava o piso dos agentes comunitários de saúde e endemias subiu para a Câmara com o valor referente aos 40%, que foi aprovado por unanimidade, já a decisão sobre o abatimento de 20% desses servidores não passou pela Câmara, sendo um ato administrativo do Poder Executivo. Lembrando que os funcionários da saúde, em geral, recebem 20% em cima do salário mínimo R$ 242,40 e agentes de endemia e agente de saúde atualmente, 20% em cima do salário base R$ 489,83.” – Myrella Soares (DEM)

 

“Os funcionários públicos de Bariri estão sendo afetados negativamente por essa gestão. Mesmo o governo federal retirando a obrigatoriedade de pagar 40% de insalubridade aos profissionais da saúde, a prefeitura de Bariri poderia manter, pois este valor faz muita diferença para os auxiliares, técnicos, enfermeiros e agentes. O vale-alimentação de Itaju passou para mil reais; o de Bauru também foi para mil reais. Porém, o vale-alimentação de Bariri continua R$ 567,00 além de ser depositado na folha –  o que tem desagradado a maioria dos funcionários públicos da nossa cidade. Os professores já foram atacados e perseguidos por essa gestão; agora, os agentes, outrora os funcionários do asfalto, os motoristas de ambulância, além dos aposentados que perderam a complementação salarial. A todo tempo, eu recebo mensagens de funcionários com medo de se manifestar publicamente, mas denunciando as regalias que tem alguns e a perseguição que sofrem outros. É triste ver uma administração tratar assim os profissionais que estão na linha de frente. Se os funcionários públicos estiverem bem e sendo valorizados, o resultado de uma administração muda totalmente. O prefeito, o vereador, o diretor não pode estar no PSF do Livramento a todo tempo, no UBS da Nova Bariri, no Cras, no Creas, na escola, no Diagnose, no Procon, na Farmácia... Quem está lá são os funcionários públicos, atendendo todo mundo em todas as demandas, ou seja, dando a cara a tapa em nosso lugar. Essa situação em que os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Endemias estão sendo submetidos é uma humilhação, no mínimo, e para ser coerente com a classe, para fazer qualquer alteração nos valores hoje pagos, o prefeito deveria submeter um novo projeto à Câmara e assim ver o que os vereadores decidiriam. O meu mandato tem servido aos funcionários públicos e continuo à disposição, para batalhar pela valorização da classe.” – Edcarlos dos Santos (PSDB)

 

“O projeto foi enviado pelo Executivo e aprovado por unanimidade e o mesmo após aprovação deve ser cumprido na sua integralidade pois passou a ser lei.” – Benedito Antônio Franchini (PTB)

 

“Poder Executivo precisa parar de gerar insegurança junto as categorias e cumprir rigorosamente o que determina a lei. Algo que infelizmente não faz por imaginar que está acima dela.” – Leandro Gonzalez (Podemos)

 

“O que ocorreu com relação a esses vencimentos do pessoal de saúde foi o seguinte:  nós votamos um projeto do Executivo que repassava os valores alterados pela lei federal para os agentes de saúde e vigilância, que foi de uma referência para outra e aumentou e deixou em ordem.  A questão da insalubridade não teve votação sobre esse item. O que acontece é que durante a pandemia a insalubridade era de 40% para todos os membros da saúde e, depois da pandemia, que foi cessada por lei federal, a insalubridade baixou para 20%. Então ouve essa diferença, mas a votação em Câmara foi referente a mudança de valores, não sobre insalubridade.” – Paulo Egídio Grigolin (PP)

 

 

Os vereadores Julio Cesar Devides (Cidadania) e Luis Renato Proti “Escadinha” (MDB) não retornaram nosso contato até o fechamento desta edição.

 

Sindicato

Também entramos em contato com o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Bariri, que encaminhou a seguinte nota, através do presidente em exercício Darci de Castro:

“O sindicato participou da reunião junto aos agentes comunitários de saúde, chamado pela chefe de Gabinete, Irene Chagas. Na reunião, ficou decidido que os agentes não aceitariam o desconto da parcela que já foi paga, mesmo porque o prefeito tinha dado sua palavra em relação aos 40% da insalubridade. Com a retirada, o sindicato já está tomando as providências cabíveis, já notificou a prefeitura através do departamento jurídico.”

 

Prefeitura Municipal de Bariri

Por fim, o Noticiantes também questionou a Prefeitura Municipal de Bariri, que enviou o seguinte posicionamento, através da Assessoria de Imprensa:

 

“Nota sobre o pagamento de insalubridade aos profissionais de Saúde pela prefeitura de Bariri

A respeito do pagamento da insalubridade aos profissionais da Saúde municipal, pela prefeitura de Bariri, a informação é de que, desde o início da pandemia de Covid-19, os profissionais da Diretoria de Saúde de Bariri passaram a receber o grau máximo de insalubridade, de acordo com determinação do governo federal, que era de 40%.

Em abril de 2022, com vigência de 30 dias após a publicação, passando a valer no fim de maio, de acordo com a Portaria do Ministério da Saúde 913/22, foi declarado o encerramento de emergência em saúde pública por causa da Covid-19.

A partir dessa determinação, todos os servidores da Saúde de Bariri passaram a receber a insalubridade que o cargo faz jus, de acordo com o LTCAT já existente na prefeitura municipal. Nos casos desses profissionais, esse laudo prevê 20% de insalubridade.”