Testemunhas indicadas por Abelardo Simões na Comissão Processante declaram em juízo que alertaram prefeito sobre irregularidades na licitação da Latina; oitivas na Câmara de Bariri começam segunda-feira
Segunda-feira (16), a Câmara Municipal de Bariri, através da Comissão Processante (CP) formada por Júlio Cesar Devides (presidente), Edcarlos Santos (relator) e Luis Renato Proti “Escadinha” (membro), dará início a fase das oitivas das testemunhas indicadas pelo prefeito Abelardo Maurício Martins Simões Filho (MDB).
Ou seja, a partir da próxima semana, prestarão depoimento à CP as 10 pessoas indicadas pela defesa de Abelardinho: Celso Carlos Cavallieri - Técnico Administrativo (Setor de Licitações); Claudenir Rodrigues "Fredy" - Diretor de Infraestrutura (Barracão); Elder Abel Viana - Agente Administrativo e ex-diretor de Obras; Edson Rodrigues dos Santos "Capetinha" - Projeto Meninos do Livra; Fernanda Cavalheiro Rossi - Diretora de Administração; Lucas Antônio de Campos - Motorista; Luis Fernando Foloni - Vice-prefeito; Marcio Rogério Nascimento - Diretor de Obras e Meio Ambiente; Paulo César de Campos "Paulada"- Projeto Arrudão; e Sincler Policarpo - Meio Ambiente.
Na teoria, a função das testemunhas é auxiliar na defesa do prefeito, que enfrenta denúncia de quebra de decoro e corre o risco de ter seu mandato cassado ao final da Comissão Processante. No entanto, a função de defesa de pelo menos quatro testemunhas arroladas por Abelardinho é colocada em xeque após declarações em juízo e exonerações não explicadas.
Testemunha Elder Viana (ex-diretor de Obras)
Ao Ministério Público, o ex-diretor de Obras e Meio Ambiente, Elder Abel Viana, declarou aos promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), que estranhou circunstâncias em torno da licitação da Latina Ambiental. Elder ocupou o cargo pelo período breve de um mês; ele foi nomeado por Abelardinho em janeiro de 2022, após a saída de Giuliano Griso da pasta. Servidor de carreira, Elder atua na prefeitura desde 2006.
Conforme os autos do processo assinado pelos promotores Nelson Aparecido Febraio Junior, Gabriela Silva Gonçalves Salvador e Ana Maria Romano, em 27 de janeiro de 2022, Elder Abel Viana, então diretor de Obras, pediu acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) do quantitativo do contrato da Latina Ambiental, justificando que o valor inicialmente contratado seria insuficiente para atender a demanda da administração.
Em depoimento ao MP, Elder revelou que determinou o aumento no valor do contrato após receber ordem de Flavio Coletta (ex-chefe de gabinete e ex-diretor de Desenvolvimento) e do próprio prefeito Abelardo Simões, que o arrolou para sua defesa na Comissão Processante.
“E Elder, ouvido, confirmou que referido pedido foi determinado por Flávio, Abelardo e Paulo (dono da Latina) em reunião realizada no gabinete do chefe do Poder Executivo. Ainda, disse que logo após o evento pediu exoneração da pasta”, cita a promotoria.
Elder ainda declarou ao Ministério Público: “um questionamento que ficou é a questão dos 25% em cinco anos de contrato. Se no primeiro ano já aumentasse 25%, e o outros quatro anos?”. Questionado pelos promotores se ele achou estranho o aditamento, declarou que: “foi uma questão que ficou em aberto”. Preocupado com a situação, Elder pediu desligamento do cargo logo depois de notar que havia algo de errado.
“O departamento financeiro propõe um reajuste em até 20% (vinte por cento), tendo o prefeito e Paulo Ricardo Barboza firmado o aditamento do contrato neste percentual, em 17 de fevereiro de 2022. Isto é, por incrível que pareça, a empresa contratada, apesar de prestar o serviço de forma parcial entre os dias 17 de junho de 2021 e 17 de fevereiro de 2022, teve o contrato ajustado em 20% (vinte por cento). O próprio Elder se assustou com o cenário”, conclui a promotoria.
O reajuste desproporcional no contrato da Latina Ambiental chamou a atenção do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, que promoveu inúmeros procedimentos de acompanhamento e fiscalização sobre a licitação, aditivos e execução do contrato em questão.
Testemunha Sincler Policarpo (Meio Ambiente)
Quatro meses após o aditamento de 25% no contrato da Latina citado por Elder, em 25 de maio de 2022, o proprietário da empresa, Paulo Ricardo Barboza, requereu a prorrogação do contrato por mais 12 meses. O acordo da prorrogação foi oficialmente firmado junho de 2022, no valor de R$ 221.600,81 (duzentos e vinte e um mil e seiscentos reais).
No entanto, conforme apontou o Tribunal de Contas, a Prefeitura de Bariri ignorou o aditivo anterior, de modo que os pagamentos após a prorrogação do contrato, foram feitos com o acréscimo de 20% – fator que gerou reserva orçamentária insuficiente.
Para piorar a situação, a Latina Ambiental não cumpriu boa parte dos serviços estabelecidos no contrato: a empresa não providenciou a poda da parte superior das árvores e a utilização do trator-triturador de galhos, embora tenha recebido pelos serviços não prestados.
Para dar ar de legalidade à manobra, Paulo Ricardo Barboza emitiu notas fiscais no valor total de R$ 2.656.898,04 (dois milhões seiscentos e cinquenta e seis mil oitocentos e noventa e oito reais), referente aos serviços não prestados. Com a emissão das notas, o prefeito Abelardo ordenou o pagamento à empresa.
A situação de que a Latina não estava cumprindo seus deveres contratuais foi levada ao prefeito Abelardo por Silcler Aparecido Policarpo, servidor do Meio Ambiente, no início deste ano. Através de portaria emitida em 13 de fevereiro de 2023, documento endereçado ao prefeito, a diretoria de Obras e aos setores de Licitação e Jurídico, Sincler fez a seguinte observação:
“Que se faz necessário uma nova estruturação em razão dos apontamentos, que foi observado no quadro de especificações de serviços que a tabela está com uma demanda muito menor do que se exige e que a falta dessa atualização de número e quantidade afeta diretamente a qualidade de serviços no município, ficando sempre com deficiência em locais prioritários em razão do mal planejamento na abertura de licitação, onde deveriam ter quantificado os serviços a campo de forma a atender as demandas com dimensionamentos reais dos serviços de capinação manual e mecanizada, podas e remoções periódicas de árvores, remoção de detritos vegetais, serviços de trituração, pinturas de guias, serviço de despraguejamentos e combate a formigas e cupins, limpeza de guias e calçamento público e outros serviços não relacionados que do ponto de vista técnico afeta o bom desempenho da limpeza pública”.
Assim como Elder, Silcler também pediu desligamento da função de “gestor do contrato da limpeza pública”, ao estranhar as circunstâncias entre Latina Ambiental e Prefeitura de Bariri, conforme aponta o Ministério público. Servidor de carreira desde 1995, ele foi ouvido pela promotoria em 23 de setembro, oportunidade na qual relatou toda a situação.
“Importante destacar que, em fevereiro de 2023, logo após a substituição do gestor do contrato, Sincler Aparecido Policarpo dá plena ciência de Paulo Ricardo e Abelardo sobre as irregularidades da execução do contrato. Aliás, vale destacar que referido gestor pediu seu desligamento após notar que o chefe do Executivo ou qualquer agente público tenha tomado providência do noticiado”.
Testemunha Celso Cavallieri (Setor de Licitações)
Outra testemunha arrolada pela defesa de Abelardinho que também prestou depoimento ao Ministério Público, foi Celso Carlos Cavallieri, técnico administrativo que atua no Setor de Licitações como pregoeiro.
Na oitiva, Celso revela que, em 2021, pretendia executar a licitação da limpeza pública no formato “pregão eletrônico”, para que o certame tivesse a participação de mais empresas do ramo. No entanto, segundo ele, o próprio prefeito Abelardo Simões impôs que a licitação ocorresse na modalidade “pregão presencial”, limitando assim o número de concorrentes.
“Que no dia seguinte da licitação, teve ciência por terceiros de que havia em torno de 07 a 10 pessoas representando outras empresas, mas que na hora marcada para licitação, somente uma empresa entrou, que foi a Latina Ambiental. Que não sabe qual o motivo dessas pessoas não terem participado. Que nesse pregão da limpeza pública de 2021, queria fazer eletrônico, para dar mais concorrência, inclusive com empresas de longa distância. Que, contudo, o Prefeito Municipal foi até a sala de licitação e pediu para fazer presencial. Que como quem assina é o prefeito, não teve como fazer eletrônico. Que chegou a fazer uma minuta de pregão eletrônico, mas como não foi autorizado pelo prefeito, ficou em seu computador. Que ainda pode ter o referido documento e se compromete a trazê-lo”, disse Celso em depoimento ao MP.
Testemunha Márcio Nascimento (ex-diretor de Obras)
Na última sexta-feira (06), uma publicação do diário oficial da Prefeitura Municipal de Bariri chamou a atenção ao revelar que o prefeito Abelardo Simões, exonerou o então diretor de Obras e Meio Ambiente, Márcio Rogério Nascimento.
Indicado pela defesa de Abelardinho para depor a favor do prefeito na Comissão Processante, a repentina exoneração não foi explicada pelas partes e gerou grande especulação na comunidade baririense: nos bastidores, a teoria mais comentada é a de que Márcio teria se recusado a fazer declarações em prol do prefeito na CP.
Nossa reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa da Prefeitura Municipal de Bariri e com o próprio Márcio Nascimento. Até o fechamento desta edição, ninguém se pronunciou acerca da exoneração.
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