Abelardinho pode ser cassado na próxima terça-feira caso vereadores sigam relatório final da Comissão Processante; confira os principais apontamentos do relator Edcarlos Santos no parecer aprovado por unanimidade
O destino do Prefeito Municipal de Bariri, Abelardo Maurício Martins Simões Filho (MDB), será traçado na próxima terça-feira (14). Na véspera do feriado da Proclamação da República, a Câmara Municipal sediará, a partir das 18h, a Sessão Julgamento, na qual será votada a denúncia que acusa o chefe do Executivo baririense de quebra de decoro. O rito, que possui caráter extraordinário, deverá ser longo: haverá leitura de documentos na íntegra, espaço para o prefeito e sua defesa se manifestarem – além da possibilidade de cada um dos nove vereadores também utilizarem a palavra pelo período de 15 minutos cada.
Nas redes sociais, está acontecendo uma grande mobilização popular de munícipes, que estão se organizando para acompanharem a Sessão Julgamento. “Povo na rua em frente à Câmara dos Vereadores no dia 14/11/2023, aos gritos. Fora Abelardinho! Vereadores representam o povo; pagos e eleitos pelo povo. Não a corrupção! Façam faixas e cartazes”, publicou um internauta.
Para ocorrer o impeachment, dois terços dos vereadores presentes no plenário precisam votar a favor da cassação (isso equivale a 6 votos, caso não haja nenhuma ausência). Caso contrário, a denúncia protocolada por Gilson de Souza Carvalho será arquivada.
A Comissão Processante (CP) aberta para investigar a quebra de decoro de Abelardinho finalizou os trabalhos na tarde de segunda-feira (06). O parecer final do relator Edcarlos Santos, que julgou a denúncia procedente, foi aprovado por unanimidade, com votos favoráveis dos outros dois integrantes da CP: Júlio Cesar Devides (presidente) e Luis Renato Proti “Escadinha” (membro).
Com quase 30 páginas, o documento detalha todos os procedimentos da comissão processante, elenca as alegações feitas pela defesa do prefeito e testemunhas, e relembra trechos da extensa petição do Ministério Público, na qual a denúncia se baseou. Ao final, a conclusão é que Abelardo Maurício Martins Simões Filho faltou com o decoro competente ao seu cargo – ou seja, o prefeito praticou atos irregulares graves durante o desempenho de suas funções.
Acompanhe abaixo um resumo dos principais apontamentos do parecer final da CP:
• Atentado criminoso com motivações políticas marca história de Bariri
Na contextualização do parecer, o relator chama a atenção, em diversos momentos do texto, de que nunca antes na história do município de Bariri, aconteceu algo semelhante com o aquilo que se desenhou na gestão Abelardinho: um esquema criminoso de fraude em licitação com coação de testemunhas (no caso, o empresário Fábio Yang e sua família).
No dia 03 de junho de 2023, Fábio Yang foi abordado em sua casa por um homem mascarado e armado. Graças aos trabalhos do Ministério Público, através do Gaeco, foi revelado que o executor do crime é o Capitão da Polícia Militar, Alexandre Gonçalves. O miliciano foi contratado pelo proprietário da Latina Ambiental, Paulo Ricardo Barboza, para dar “um susto” na vítima, em represália às denúncias sobre irregularidades na licitação da Latina aos órgãos competentes – denúncias que também foram veiculadas no Jornal Noticiantes. Após ser preso, o próprio Barboza relevou que o autor intelectual do atentado foi o prefeito de Bariri, Abelardo Simões.
“Em nenhum momento da política baririense uma de nossas famílias foi colocada em risco por meras posições políticas; pai, mãe e filhos baririenses, jamais correram risco de morte por causa de matéria jornalística investigativa, ou licitação pública, como aconteceu no atentado contra o empresário Sr. Fábio Yang e sua família. Não se pode fechar os olhos para um acontecimento gravíssimo como este (...). O Sr. Paulo Ricardo Barboza, proprietário da empresa Latina, teve a ousadia de contratar um miliciano e mandar vir em nossa cidade, atacar uma família (...). Nunca antes na história política de nossa cidade tantas pessoas ligadas a um prefeito foram presas - e isso não pode ser considerado comum, não podemos deixar que isso se normalize.”
• Megaoperação do Gaeco no Paço Municipal, repartições públicas e endereços de ex-diretores de confiança de Abelardinho
O dia 8 de agosto de 2023 ficou marcado como “o dia que o Gaeco tomou conta da cidade”. Os promotores do Ministério Público deflagraram uma megaoperação, que teve como alvo a Prefeitura Municipal de Bariri, Diretoria de Obras, endereços ligados à ex-diretores e empresário apontado como o “pau mandado” de Abelardinho.
Depois disso, três pessoas foram presas (Paulo Ricardo Barboza, Alexandre Gonçalves e Abílio Giacon Neto) e cinco pessoas viraram réus (Flávio Coletta, Giuliano Griso, Paulo Ricardo Barboza, Alexandre Gonçalves e Abílio Giacon Neto). Os investigados tiveram R$ 11 milhões em bens bloqueados e respondem pelos crimes de: organização criminosa, frustração ao caráter competitivo de licitação, fraude na execução dos contratos, corrupção ativa e passiva, coação no curso no processo e roubo.
“Este dia 8 de agosto revelou o papel indecoroso do Sr. Abelardo, prefeito municipal; primeiro, por permitir que algo deste nível acontecesse em sua gestão. Segundo, por escancarar em todos os jornais do Brasil o nome de Bariri de maneira negativa. Terceiro, por ter perdido a confiança da Justiça, que não permitiu que entrasse no próprio gabinete. Quarto, por ter fugido da responsabilidade e deixado os funcionários sozinhos naquela ocasião. Hoje, Bariri figura nas páginas policiais por conta de toda corrupção realizada na gestão do Sr. Abelardo, mas não apenas por isso. Se não bastassem as maracutaias, os desvios do dinheiro, as fraudes em licitações apontadas pelo Ministério Público, ainda existe o desgoverno, que tem lançado Bariri em um abismo.”
• Testemunhas dispensadas
Após arrolar 10 testemunhas para prestarem depoimento em sua defesa à Comissão Processante, Abelardinho voltou atrás e dispensou 7 pessoas.
O ato chamou a atenção, uma vez que a maioria das testemunhas dispensadas pela defesa do prefeito, testemunharam, ao Ministério Público, em seu desfavor: Sincler Policarpo (servidor do Meio Ambiente); Claudenir Rodrigues “Fredy” (ex-diretor de Infraestrutura); Elder Abel Viana (ex-diretor de Obras); e Celso Cavallieri (servidos do Setor de Licitações). Já a testemunha Márcio Nascimento (ex-diretor de Obras) foi exonerado do cargo à pedido do Ministério Público. Os outros dois dispensados foram Paulo Cesar de Campos “Paulada” (do projeto Arrudão) e Eder Nascimento “Capetinha” (do projeto Meninos do Livra).
“O prefeito arrolou 10 testemunhas em sua defesa, mas dispensou 7 delas. Sobre a licitação fraudada objeto desta denúncia e a execução do serviço prestado pela Latina Ambiental, as pessoas que dentre as testemunhas poderiam falar com propriedade, por terem participado da licitação, atuado como gestoras do contrato, ou por ocuparem diretorias responsáveis pelas pastas afins, mas foram justamente as testemunhas dispensadas pela defesa.”
• Motorista confirma apontamento do MP e estratégia da defesa do prefeito falha
Dentre a três testemunhas que prestaram depoimento à CP, a oitiva de Lucas Antônio de Campos, servidor público de carreira, que atua como motorista, chama a atenção: ele confirmou que a empresas terceirizadas realmente utilizavam maquinário e combustível da Prefeitura Municipal de Bariri para executar seus serviços. A manobra que garantiu margem de lucro à Latina, às custas dos cofres públicos, foi apontada pelo Ministério Público como grave irregularidade.
Interrogado pela defesa de Abelardo, Lucas confirma a manobra, justificando que administrações anteriores também praticavam o mesmo ato.
“Na tentativa de contrapor à acusação, a defesa do prefeito contribui para o esclarecimento e a comprovação de que o crime apontado pelo Ministério Público é um fato que acontece desde gestões anteriores. A fala do motorista apenas ratifica a acusação, pois eventual desdobramento de ilegalidades como forma sistemática no âmbito de Bariri, chegando a alcançar administrações passadas, em nada justifica a manutenção da corrupção e da lesão ao patrimônio público. Aqui podemos vislumbrar a mentalidade do Sr. Abelardo: ele não veio à Comissão Processante para dizer que não sabia deste fato, infelizmente, ele traz uma testemunha para ratificar a acusação, apenas reconhece que isso já era feito pelos outros gestores e que continua em sua gestão. Tenta, portanto, desqualificar as acusações que pesam contra ele e sobretudo desqualificar o trabalho impessoal conduzido pelo Ministério Público.”
• Diretora Administrativa não contribui, enquanto vice-prefeito acusa sem provas e desafia promotoria
Segundo o relator, a oitiva de Fernanda Cavalheiro Rossi, diretora de Administração Pública, foi irrelevante para a Comissão Processante.
“[Fernanda] disse que só começou trabalhar na gestão atual em julho de 2022, ou seja, um ano após a licitação fraudulenta, por meio da qual a empresa Latina Ambiental sagrou-se vencedora. Sem ter participação nenhuma neste processo (...) é claro que não poderia contribuir para elucidar
tal fato, ou muito menos para falar se o prefeito interferiu ou não interferiu na licitação fraudulenta de limpeza pública. Assim, sob a ótica da prova oral colhida, o depoimento da testemunha Fernanda deve ser concebido como prova impertinente, eis que nada diz respeito aos fatos efetivamente apurados.”
Já a conduta do vice-prefeito Fernando Foloni foi mais grave: o relatório aponta que o radialista fez inúmeras acusações sem provas, atacou vereadores e questionou a idoneidade dos trabalhos do Ministério Público, através dos promotores do Gaeco responsáveis pelo caso (Nelson Aparecido Febraio Junior, Gabriela Silva Gonçalves Salvador, Ana Maria Romano e Paula Garmes Reginato Coube).
“O Sr. Fernando Foloni disse que o Ministério Público não deveria investigar apenas o Prefeito, mas que deveria investigar todos – em outras palavras, é como ele dizer que o Ministério Público está fazendo uma investigação parcial, ou perseguindo o Sr. Abelardo. O vice-prefeito diz que o Promotor deveria investigá-lo também e investigar todos os vereadores, inclusive faz acusações
gravíssimas sobre os membros do Legislativo. Ao falar à comissão, o depoente acusou, mas não apresentou provas, desferiu ataques a várias pessoas, principalmente a membros desta Casa.”
• Abelardinho acusa Jornal Noticiantes de “perseguição política”; fala do prefeito reforça interesse em atentado contra empresário
Em sua oitiva, o prefeito Abelardo Simões disse sofrer “perseguição política” pelo Jornal Noticiantes. No entanto, a fala do prefeito reforçou as alegações do proprietário da Latina Ambiental, Paulo Ricardo Barboza. Em interrogatório, Barboza disse que só articulou o atentado criminoso contra o empresário Fábio Yang porque o prefeito lhe mostrava, constantemente, as matérias do Jornal Noticiantes que denunciavam irregularidades da Latina em Bariri.
Dessa forma, Abelardinho reforçou a acusação de Barboza: ao demonstrar incômodo com o conteúdo do Noticiantes, o prefeito mostra que a tentativa criminosa de “calar” o jornal realmente era algo pertinente à sua pessoa.
“Sr. Abelardo, confirma, sem a necessidade de acareação, que as falas do Sr. Paulo Ricardo Barboza são procedentes, pois de fato ele acusa o jornal de lhe perseguir politicamente, o que revela razoáveis indícios de que efetivamente tinha interesse no atentado cometido contra o empresário, demonstrando que neste contexto não está inserido de forma "aleatória" pelo MP (...). O miliciano veio aqui para tentar frear as críticas que o jornal fazia contra o prefeito, isto está muito claro. Sabemos quem é o miliciano que cometeu atentado, ele está preso; sabemos quem o contratou, e foi o dono da Latina, empresa de limpeza pública contratada pela prefeitura. E não há dúvidas das motivações, elas são patentes, visíveis e são lançadas em nossa face: o objetivo do atentado contra o empresário, era fazer o jornal pertencente ao Sr. Fábio Yang e sua esposa Sra. Nathalia Kerbauy Ferro Yang, parar de criticar o Sr. Abelardo, prefeito municipal de Bariri.”
• Prefeito culpa funcionários públicos por entrega de livro com sua assinatura ao proprietário da Latina, mas não cita nomes, tampouco provas
Entre os itens apreendidos pelo Gaeco em endereços na cidade de Limeira-SP ligados à Paulo Ricardo Barboza, proprietário da Latina Ambiental, a promotoria encontrou um exemplar do livro “Eu não sabia que era tão longe”, de autoria de Osni Ferrari. A obra é focada na história do mecânico baririense e herói mundial, Mário Fava; na contracapa do livro, havia uma breve dedicatória, assinada e carimbada pelo prefeito Abelardo Simões. No interior do exemplar, foram encontrados cartões de visita do empresário Abílio Giacon Neto, uma das pessoas que recebiam as propinas da Latina em nome do prefeito Abelardo.
O chefe do Executivo falou sobre este fato à Comissão Processante, e negou sua participação no caso com um discurso vazio. Conforme apontou o Ministério Público, o livro teria sido uma espécie de presente de Abelardo ao empresário de Limeira, em uma das ocasiões que Barboza esteve na Prefeitura de Bariri.
“O Prefeito, como de costume, tentou jogar nas costas dos funcionários públicos a entrega do livro ao empresário; no entanto, ele não nos apresentou a pessoa que fez essa entrega; disse, ainda, que é costume deixar vários livros assinados e que os funcionários de sua confiança presenteiam pessoas com os livros, mas este funcionário que teria presenteado o dono da Latina com o Livro, não foi arrolada como testemunha da defesa. O prefeito teve essa oportunidade, poderia ter sanado esta questão, trazendo esta pessoa, se de fato ela existisse, mas não o fez.”
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