Defesa de Abelardo Simões diz que “não existe menção ao prefeito” em ação que investiga esquema criminoso de fraude em licitações na Prefeitura de Bariri: relembre as principais citações à Abelardinho no processo do Ministério Público
Em entrevista a uma emissora de rádio local, o advogado dr. André Luiz Gonçalves Racy, responsável pela defesa do prefeito Abelardo Maurício Martins Simões (MDS), sustentou que Abelardinho não foi mencionado no processo do Ministério Público, que através do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), investiga a organização criminosa instalada na Prefeitura Municipal de Bariri.
Abelardinho virou alvo de uma Comissão Processante (CP) aberta por unanimidade dos vereadores da Câmara Municipal – procedimento este que pode culminar na cassação do mandato político do prefeito por quebra de decoro. Protocolada pelo cidadão baririense Gilson de Souza Carvalho, a denúncia que deu origem à CP se baseia inteiramente na investigação do Ministério Público. O inquérito já rendeu, até o presente momento, sete réus e quatro prisões preventivas. Todos os envolvidos estão ligados diretamente ao esquema de fraude em licitações instalado no Paço Municipal, manobra articulada por diretores do alto escalão da gestão Abelardo-Foloni, empresários e apoiadores políticos do prefeito.
O prefeito de Bariri, no entanto, não pode ser investigado pelo Judiciário local por possuir o chamado “foro por prerrogativa de função”, uma espécie de foro privilegiado, em decorrência de seu cargo no Executivo. Por esse motivo, a Promotoria de Justiça local solicitou que a Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) realize investigação em separado em face de Abelardo.
“A denúncia é genérica. Parte de uma petição para a abertura de uma investigação (...). Me parece que a apresentação dessa denúncia é prematura. Os fatos precisam ser apurados e esclarecidos. Um elemento fundamental é que a própria petição do Ministério Público é baseada em uma investigação de buscas e apreensões de mais de três mil páginas. Tem interceptação telefônica, quebra de sigilo telemático, busca e apreensão de aparelhos eletrônicos, cópia de conversas de WhatsApp... só de interceptação telefônica são mais de mil páginas. Eu li as mil páginas e não existe nenhuma menção ao prefeito”, disse dr. André Luiz.
Afinal, como o prefeito de Bariri é mencionado no processo? Para esclarecer os principais momentos em que Abelardinho é citado no extenso documento do Ministério Público, nossa reportagem preparou um resumo das vezes que o nome (Abelardo) ou o cargo público (prefeito / chefe do Executivo) aparecem na petição e anexos, seja citado diretamente pela promotoria, seja mencionado nos interrogatórios dos réus e demais testemunhas ouvidos em oitivas. Acompanhe a seguir:
• Promotoria comunica crimes cometidos por Abelardinho ao TJ
Em 04 de setembro de 2023, o Ministério Público protocolou documento intitulado “Procedimento Investigatório Criminal” referente ao processo nº 1501008-43.2023.8.26.0062. Nele, os promotores Nelson Aparecido Febraio Junior, Gabriela Silva Gonçalves Salvador e Ana Maria Romano, pedem comunicação imediata ao Tribunal de Justiça (TJ), além da distribuição a uma das Câmaras Criminais “por contundentes elementos dando conta do cometimento de crimes por parte do Senhor Prefeito Municipal em exercício no Município de Bariri, Sr. Abelardo Maurício Martins Simões Filho”.
A promotoria requer urgência na comunicação “inclusive para verificação de desmembramentos das investigações a fim de que os crimes eventualmente praticados pelo Prefeito Municipal Abelardo tramitem pelo Tribunal de Justiça”.
A seguir, o MP diz que, com interrogatório de Paulo Ricardo Barboza, proprietário da Latina Ambiental (empresa vencedora da licitação de limpeza pública), “o cenário foi revelador do envolvimento de Abelardo Maurício Martins Simões Filho em crimes de corrupção passiva, concussão, fraudes licitatórias, fraudes processuais, coação no curso do processo e, ainda, mandante do atentado contra a vítima Fábio Yang”.
• Interrogatório do dono da Latina revela pagamento de propina à Abelardinho
Em depoimento ao Gaeco Paulo Ricardo Barboza cita o nome do prefeito de Bariri, revelando detalhes do esquema de propina que mantinha com Abelardinho para manutenção da licitação de limpeza ambiental no município. Através de uma agenda apreendida em um dos imóveis ligados à Paulo Ricardo, foram encontradas anotações à mão dos valores, que variavam entre R$ 7.750,00 e R$ 20.000,00 mensais.
“Questionado expressamente sobre pagamento de propina, confirmou que pagava valores a pessoas da prefeitura por conta de seu contrato. Disse que entregava o dinheiro para “o chefe”. Questionado quem seria o chefe, disse ser o Prefeito Municipal de Bariri, o sr. Abelardo. Confirma que pagava propina a título de extorsão. A extorsão se dava porque ele tinha a “caneta” para pagar as notas fiscais ou não, ou mesmo atrasar. Se Paulo não pagasse valores, não haveria o pagamento regular de sua empresa. Paulo tratava, neste momento, diretamente com Abelardo, sem intermediador”, concluiu o MP.
• Documentos obtidos durante busca e apreensão entregam participação de Abelardinho em reunião com os réus
A investigação apurou que em 09 de fevereiro de 2021, Paulo Ricardo Barboza esteve em Bariri, onde se reuniu com Abelardinho e outras pessoas do governo. O encontro, segundo o MP, serviu para negociar os trâmites em torno da licitação da Latina Ambiental.
“Localizamos documentos que indicavam que, nesta data, a reunião também contou com a participação do Prefeito Municipal Abelardo e foi específica para os detalhes da fraude, com participação de Flávio Coletta e Abílio Giacon.”
Nesta reunião, Abelardinho entregou ao dono da Latina um exemplar do livro “Eu não sabia que era tão longe”. O prefeito de Bariri, inclusive, carimbou e assinou a obra como uma espécie de dedicatória. No interior do livro foram encontrados cartões de visita do empresário Abílio Giacon Neto, definido como o “pau mandado” de Abelardinho.
“Paulo Ricardo foi agraciado com um livro e dedicatória do Prefeito Abelardo enquanto tratavam das fraudes. Ainda, no mesmo livro, havia cartões de Abílio Giacon Neto, que também esteve na reunião”.
• Autoria de Abelardinho em atentado contra empresário
No dia 02 de junho de 2023, o empresário Fábio Yang sofreu assalto à mão armada após ter sua casa invadida por um homem encapuzado. A vítima sofreu ameaça de morte por conta de denúncias feitas ao Ministério Público e Tribunal de Contas, contra o esquema da Latina Ambiental em Bariri.
A investigação apontou que o criminoso, identificado como Alexandre Gonsalves (Capitão da Polícia Militar), foi contratado pelo dono da Latina, Paulo Ricardo Barboza. Em depoimento, Barboza confessou que agiu cumprindo ordens do prefeito Abelardinho e dos réus Flávio Coletta e Abílio Giacon, que o pressionavam, em nome do prefeito, com o objetivo de amedrontar e calar a vítima.
“Para os agentes públicos, a empresa Latina era o calcanhar de Aquiles, era um contrato problemático desde o início. A mando do prefeito, enchiam Paulo diariamente de informações, dizendo “você tem que resolver essa situação”, para resolver com o Fábio Yang. O prefeito dizia que conversar com Fábio não iria adiantar (...). Como se vê, houve expressa indicação de que o prefeito Abelardo exigiu valores a título de propina, auxiliou em fraudes contratuais e, ainda, foi autor intelectual das graves condutas violentas praticadas em face de Fábio Yang”, concluiu o MP.
• Dona de floricultura diz que Abelardinho pediu que ela coordenasse contrato da Latina
Em depoimento ao promotor Nelson Aparecido Febraio Júnior, a proprietária de uma floricultura contratada com dispensa de licitação pela gestão Abelardinho, revelou detalhes sobre o esquema da Latina Ambiental em Bariri.
Contratada para prestar os servidos de jardinagem, mão de obra e revitalização das praças do município de Bariri, a depoente disse que, a pedido do prefeito, passou a coordenar os serviços da Latina na cidade: “Fui perguntar para o Abelardo como ficava a minha situação se as praças estavam paradas. Ele me pediu se eu não poderia ajudar com os trabalhos da empresa Latina, porque os encarregados eram de fora e não tinham conhecimento das áreas do nosso município".
Após perceber que o contrato de licitação da Latina havia sido alterado – fator que deixou o serviço com menos funcionários e menos maquinário, prejudicando a limpeza pública na cidade – ela pediu demissão. O depoimento confirma informações já reveladas anteriormente pela investigação: a Latina Ambiental recebia mensalmente da prefeitura por serviços não executados.
Ainda segundo a depoente, Abelardinho tinha pleno conhecimento da situação. “Marquei um dia, conversei com o Abelardo. Ele falou que iria resolver, que iria dar um jeito”, disse a empresária. Ela conta ainda que conheceu Paulo Ricardo Barboza, proprietário da empresa de limpeza pública, através do próprio Abelardinho.
• Ex-diretor de Obras e servidor do Meio Ambiente pedem desligamento de funções após notarem irregularidades no contrato da Latina
Ao Ministério Público, o ex-diretor de Obras e Meio Ambiente, Elder Abel Viana, declarou aos promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), que estranhou circunstâncias em torno da licitação da Latina Ambiental, após o Abelardinho e Flávio Coletta pedirem que ele reajustasse o valor mensal do contrato da Latina em 20%.
“Elder confirmou que referido pedido foi determinado por Flávio, Abelardo e Paulo (dono da Latina) em reunião realizada no gabinete do chefe do Poder Executivo. Ainda, disse que logo após o evento pediu exoneração da pasta”.
Já o servidor público do Meio Ambiente, Sincler Aparecido Policarpo, endereçou portaria ao prefeito, para alertar que a Latina não estava cumprindo todos os serviços previstos no contrato.
“Importante destacar que, em fevereiro de 2023, logo após a substituição do gestor do contrato, Sincler Aparecido Policarpo dá plena ciência à Abelardo sobre as irregularidades da execução do contrato. Aliás, vale destacar que referido gestor pediu seu desligamento após notar que o chefe do Executivo ou qualquer agente público tenha tomado providência do noticiado”.
• Pregoeiros afirmam que Abelardinho exigiu modalidade de pregão que reduz número de concorrentes em licitação da limpeza pública
Celso Carlos Cavallieri, técnico administrativo que atua no Setor de Licitações como pregoeiro, disse ao Ministério Público que pretendia executar a licitação da limpeza pública no formato “pregão eletrônico”, para que o certame tivesse a participação de mais empresas do ramo. No entanto, segundo ele, o próprio prefeito Abelardo impôs que a licitação ocorresse na modalidade “pregão presencial”, limitando assim o número de concorrentes.
“Que nesse pregão da limpeza pública de 2021, queria fazer eletrônico, para dar mais concorrência, inclusive com empresas de longa distância. Que, contudo, o Prefeito Municipal foi até a sala de licitação e pediu para fazer presencial. Que como quem assina é o prefeito, não teve como fazer eletrônico. Que chegou a fazer uma minuta de pregão eletrônico, mas como não foi autorizado pelo prefeito, ficou em seu computador”.
As declarações da agente administrativa do setor de licitações, Aparecida Eliana Cardoso Pires, que também exerce função de pregoeira, também confirmam a ordem do prefeito em relação à modalidade da licitação de limpeza pública.
“Eu e o Celso pensamos em fazer o pregão eletrônico, mas eles preferiram fazer presencial. Essa licitação é muito tumultuada, pensamos em fazer eletrônico para ser mais tranquilo e ter mais concorrência. O prefeito pediu para não fazer, que fosse feito presencial”, disse a servidora.
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