Pizza, ódio e paixão
Ela enfrentava a fase mais difícil de sua vida até então: tudo dava errado. Chegou a ir a uma vidente, que através das cartas do tarô previu que ela iria se apaixonar por alguém que gostava muito de automóveis e velocidade, e a quem conheceria durante uma aventura. Ela estranhou, afinal, mal saía de casa, ainda mais para aventuras, seja o que for que isso significasse.
Naquela noite, uma sequência de “efes” a incomodavam. Ela estava faminta, pois havia usado o horário do almoço no trabalho para resolver problemas da empresa. Também estava duplamente furiosa. Primeiro porque, como diz o velho ditado inglês, “a hungry woman is a angry woman”, ou seja, “uma mulher faminta é uma mulher raivosa” (atenção: este ditado também é aplicável aos homens!). Segundo porque seu chefe, além de não reconhecer seu esforço, havia lhe feito críticas severas e desmerecidas.
O toque do interfone fez com que ela saísse daquele tormentoso oceano de divagações e retornasse à realidade. Era o antídoto para eliminar o primeiro efe, o da fome. Pediu gentilmente ao entregador que levasse a pizza até a porta de seu apartamento. A resposta foi negativa. A mulher insistiu e ouviu um sonoro “não”. Então disse que ele deveria ser mais educado. Ele retrucou afirmando que sua obrigação era entregar a comida na portaria, e se ela não descesse logo ele iria embora. A fome falou mais alto, mas não aplacou a ira da mulher. Daria uma exemplar lição de boas maneiras àquele velhote metido a importante. Isso mesmo: só poderia ser um velho pretensioso, descontente com a vida, para tratar uma mulher e cliente com tanta grosseria. Ele também se julgava injuriado e desrespeitado. Se a mulher não tinha condições de ir até a portaria, que não pedisse a comida. Ele não trabalhava em um asilo! Sua vida andava complicada – a moto que mal acabara de pagar havia sido roubada. As prestações da nova estavam atrasadas. Ele não aguentaria as impertinências de uma velha rabugenta.
A porta do elevador se abriu. A mulher deu o primeiro passo e ficou paralisada. O entregador também ficou petrificado. Um silêncio ensurdecedor tomou conta do local. Estaria para acontecer uma tragédia? Tudo estava indicando que sim – mas a realidade era bem outra. Ele esperava encontrar uma mulher judiada pela vida, mas encontrou outra, linda e encantadora. Esperava achar uma bruxa e achou uma princesa. E a princesa, que esperava encontrar um “sapo”, encontrou um príncipe. O cupido aproveitou esse momento mágico para disparar suas flechas, que atingiram os alvos com precisão. Casaram-se em 6 de julho passado, no Rio de Janeiro, onde moram.
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