Agente da Vigilância Epidemiológica sugere negligência, diz que Diretoria de Saúde entregou repelentes somente após morte de servidora e faz apelo: “Apenas sete agentes não são suficientes para conter epidemia de dengue em Bariri”

Agente da Vigilância Epidemiológica sugere negligência, diz que Diretoria de Saúde entregou repelentes somente após morte de servidora e faz apelo: “Apenas sete agentes não são suficientes para conter epidemia de dengue em Bariri”

“Todos conhecemos um ditado antigo que fala assim ‘é melhor prevenir do que remediar’. Prevenir é mais eficaz e mais barato. Não foi essa escolha que o município de Bariri adotou” – Rodrigo Villela, Agente de Combate a Endemias

 

Os minutos iniciais da primeira Sessão Ordinária de 2024, ocorrida segunda-feira (05), na Câmara Municipal de Bariri, foram marcados por um discurso forte. Utilizando a tribuna, Rodrigo Reis Villela, Agente de Combate à Endemias da Vigilância Epidemiológica há mais de 20 anos, representou a equipe de oito servidores – equipe esta que perdeu um membro na última semana: Daniele Joana Ramos Caçador da Silva.
Vítima de dengue hemorrágica, doença provavelmente contraída enquanto trabalhava na visitação casa a casa, Daniele faleceu aos 33 anos de idade, quinta-feira passada (01). Com o óbito, a equipe de combate a endemias, agora, é composta por sete servidores para atender uma população de 35 mil habitantes.
No Legislativo, Rodrigo reforçou que a Vigilância Epidemiológica alertou a municipalidade sobre uma possível epidemia de dengue em outubro do ano passado. Apesar do aviso, a administração Abelardo-Foloni não realizou nenhuma ação para evitar a proliferação da doença – ou seja, um possível cenário de negligência do governo frente à dengue.
O ex-prefeito Abelardo Simões, ocupou a cadeira do Executivo até 15 de novembro, data de sua cassação. Após o impeachment, Fernando Foloni assumiu. Nenhum dos dois realizou qualquer ação no final do ano passado, mesmo tendo conhecimento do problema iminente, como explicou Rodrigo. 
“Esta epidemia não é novidade para nós. Temos números do nosso trabalho que comprovam, desde outubro do ano passado, que a prefeitura foi advertida; que o número de larvas encontrado dentro das casas era alto e que medidas eram necessárias, mas elas não foram atendidas. A Vigilância Epidemiológica não dispõe de autonomia. Não tomamos decisões e nem definimos o que vai ser feito”, começou Rodrigo.

 

Índice larvário em Bariri é cinco vezes maior que o recomendado

Segundo o agente, a cada três meses, a equipe de combate a endemias realiza um trabalho, em toda cidade, para verificar a chamada Avaliação de Densidade Larvária (ADL); trata-se se um estudo utilizado para descobrir os índices de infestação do mosquito Aedes aegypti no município. 
As residências visitadas (cerca de 600 casas em várias regiões da cidade) são sorteadas pela Diretoria Municipal de Saúde. Todas as larvas encontradas são coletadas e levadas para análise laboratorial. 
“No ADL realizado em outubro do ano passado, o resultado colocou nosso município em alerta para epidemia. Para vocês terem um alerta da gravidade, o índice tolerável da Secretaria de Saúde é 1,0. O resultado de Bariri, em outubro, deu 4,01. Com esses resultados em mãos, a Vigilância Epidemiológica alertou a administração e fez solicitações para realizar as atividades de prevenção. Em 26 de outubro de 2023, foi realizado reunião dentro do gabinete do prefeito, junto com a Diretoria de Infraestrutura, sobre a necessidade de se fazer um mutirão de limpeza. Até agora, esse mutirão não foi realizado”, expôs o servidor.
No mês de janeiro, o índice ADL assustou ainda mais: 5,53, cinco vezes acima do tolerável. 

 

Número de agentes nas ruas poderia ser mais que o dobro 

Segundo Rodrigo, o Ministério da Saúde, através do parâmetro nacional, recomenda que Bariri poderia ter 18 agentes de combate de endemias – mais que o dobro do número atual (sete).
“Se houvesse 18 agentes de combate a endemias, o Ministério Público faria o repasse de 95% do salário desses 18 agentes. Hoje, somos sete; éramos oito até semana passada. Quando entrei na Vigilância em 2002, a equipe contava com 10 agentes que cobriam em torno de 500 quadras. Hoje em dia, o município possui 900 quadras em seu perímetro urbano, contando apenas com sete agentes. Eu acho que essa balança está muito desigual, não é? Enquanto o perímetro urbano quase dobrou de tamanho, o número de agentes diminuiu”, conclui.
Ele garante que a Vigilância Epidemiológica levou a demanda sobre a contratação de mais agentes à Diretoria Municipal de Saúde, pasta comandada por Irene Chagas. No entanto, a solicitação não foi atendida. 
“Mesmo com repasse de 95% do salário feito pelo Governo Federal, as palavras da diretora foram que o município não dispunha de contrapartida para pagar o vale alimentação e os encargos para fazer essas contratações”, argumenta Rodrigo.
Na sequência, o agente fez uma comparação. De acordo com ele, o trabalho de nebulização costal feito por uma empresa terceirizada, custa, diariamente, R$  3.350,00 aos cofres públicos. 
“Se nós descontarmos os 95% do repasse feito pelo Governo Federal, uma diária de nebulização pagaria três meses de salário de um Agente de Combate a Endemias. No ofício número 48/2023, foi solicitada a contratação de quatro agentes, mas o pedido foi negado pela administração. Até o momento, já foram feitas 18 diárias de nebulização. Se você fizer uma conta rápida, 18 diárias totalizam R$ 60 mil. Daria para pagar o salário dos quatro agentes que tiveram sua contratação negada”.
Rodrigo disse que os quatro Postos Saúde da Família (PSFs) de Bariri, contam com 24 agentes de saúde, e cobrem uma área correspondente a 36% do território de Bariri.
“Nós, ACEs, cobrimos 64% da área da cidade, com apenas sete agentes. Nós não trabalhamos exclusivamente no combate à dengue; realizamos outras atividades, como o combate ao escorpianismo, leishmaniose, raiva, doença de chagas, entre outras. Essas atividades também demandam cuidado, tempo e não podem ser ignoradas. Apenas sete pessoas não são suficientes para conter a epidemia de dengue na cidade”, desabafa.

 

Sem repelente 

Uma das acusações mais sérias feitas por Rodrigo é em relação à falta de distribuição de repelentes aos servidores da Vigilância Epidemiológica. Ele diz que o pedido foi feito, mas que a Diretoria Municipal de Saúde só realizou a entrega do produto após o falecimento da agente Daniele Caçador. 
“Estamos trabalhando em área de alta transmissibilidade de dengue, mas nem repelente nos foi disponibilizado. O primeiro pedido foi efetuado dia 08 de novembro de 2023. Os casos começaram em novembro e estamos em fevereiro. O segundo pedido foi efetuado em 8 de janeiro de 2024. Os repelentes só foram entregues três meses depois, na última sexta-feira, 2 de fevereiro –  um dia após o falecimento de uma das agentes”, alega o servidor.
Ele exibiu uma embalagem do produto entregue pela prefeitura quando estava na tribuna. O repelente em questão, da marca “Moskitoff”, tem custo médio de R$ 13,00.
“O valor é R$ 13,00 e demorou três meses para ser entregue. Os míseros R$ 13,00 poderiam ter salvado uma vida se fossem entregues antes. Todos conhecemos um ditado antigo que diz: ‘é melhor prevenir do que remediar’. Prevenir é mais eficaz e mais barato. Não foi essa escolha que o município de Bariri adotou”. 

 

Agentes propõe homenagem póstuma a colega de trabalho 

Ao final de seu discurso na tribuna, Rodrigo explanou aos vereadores uma sugestão dos agentes da Vigilância Epidemiológica de Bariri: nomear a unidade em homenagem à Daniele Joana Ramos Caçador da Silva.
“Nós, da Vigilância Epidemiológica, gostaríamos muito que o setor da vigilância epidemiológica levasse o nome da Daniele. Ela merece isso; ela não será esquecida e, sua morte, não será em vão”.
O discurso foi ovacionado e emocionou vereadores, além de demais pessoas presentes no plenário legislativo.