Baririenses podem recorrer judicialmente contra taxa ilegal cobrada pela prefeitura via carnê de IPTU nos últimos cinco anos, diz jurista
Por Thaisa Moraes
Nas últimas semanas, centenas de baririenses receberam, via aplicativo de mensagens WhatsApp, um comunicado sobre supostas irregularidades na cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), emitido pela Prefeitura Municipal de Bariri.
“O município de Bariri vem cobrando mensalmente a taxa de desastres, todavia essa taxa é ilegal e inconstitucional. O Supremo Tribunal Federal tem mantido o mesmo entendimento para todas as taxas cobradas pelos municípios que não sejam específicas e divisíveis. Contudo, ainda é necessário o ajuizamento de um processo para que haja uma determinação judicial, cancelando esta cobrança e permitindo a restituição do que foi pago nos últimos 05 anos”, diz a mensagem assinada por um escritório de advocacia localizado na cidade de Jaú.
Em Bariri, a “Taxa de Proteção e Desastres” foi aprovada pela Câmara Municipal em 2017 e passou a ser cobrada a partir de 2018, juntamente com o carnê de IPTU. Na época, o Executivo Municipal estava sob o comando do prefeito interino Paulo Henrique Barros de Araújo. Segundo a prefeitura, o objetivo da “Taxa de Proteção de Desastres” é a manutenção dos serviços do Corpo de Bombeiros.
Neste ano, o Setor de Lançadoria e Dívida Ativa da Prefeitura Municipal de Bariri entregou os carnês de IPTU no início de fevereiro. A expectativa é que o imposto arrecade cerca de R$ 10,3 milhões aos cofres públicos. No carnê, a “Taxa de Proteção e Desastres” aparece descrita acima da “Taxa de Coleta de Lixo”.
Nossa reportagem recebeu questionamentos de leitores que receberam a mensagem sobre a ilegalidade da taxa. Para sanar as dúvidas, solicitamos a consultoria do dr. Geraldo Barbieri Junior, advogado graduado pela PUC/SP e especialista em direito imobiliário e urbanístico. À nossa reportagem, o jurista confirmou a cobrança irregular da Taxa de Proteção e Desastres.
“O conceito é simples. Taxa é modalidade de tributo que somente pode ser instituída quando há um serviço público específico e divisível efetivamente prestado pelo Estado. Ou seja, para que seja instituída uma taxa, o contribuinte deve receber direta e individualmente o serviço público a ser custeado com os recursos arrecadados por tal encargo fiscal. Se recolhe taxa, o usuário deve perceber, em sua rotina, a atuação ativa do Poder Público na prestação daquele serviço, conseguindo sentir-se destinatário direto daquela prestação estatal – como ocorre com o recolhimento do lixo domiciliar, por exemplo. Daí porque a taxa é uma modalidade tributo vinculado diretamente a um serviço público determinado e que deve ser: (I) especificado na lei que o institui; e (II) efetivamente prestado de forma individual a cada cidadão. Já os impostos e as contribuições sociais são tributos cuja arrecadação não possui destinação específica, ingressando nos cofres públicos para livre utilização nas demandas gerais de gestão administrativa, tais como saúde, educação, assistência social, infraestrutura, etc. Daí que esses são denominados de tributos não vinculados. É o caso do IPTU e do ISS. No caso da "Taxa de Proteção e Desastres", cobrada anualmente pelo Município de Bariri juntamente com o carnê do IPTU, há flagrante vício de inconstitucionalidade em sua instituição, já que o serviço público que se visa custear com a arrecadação de tal espécie tributária, qual seja, combater eventos hipotéticos como a ocorrência de incêndios, por exemplo, não caracteriza serviço público individualmente percebido pelo contribuinte, e sua arrecadação se presta a custear demanda futura e incerta, ainda que potencial, mas que não se relaciona com algo que o contribuinte usufrui de forma contínua, direta e individual em seu cotidiano”, explica dr. Geraldo.
O advogado também ressalta que os cidadãos baririenses que se sentirem lesados com a ilegalidade e quiserem acionar a Justiça contra a cobrança, podem entrar com uma ação para reverter o débito dos últimos cinco anos.
“Não se discute que exista o serviço público custeado com a arrecadação dessa taxa, tampouco sua eficiência no âmbito da municipalidade, no entanto ele não preenche os requisitos para que seu custeio se dê pelas receitas de uma taxa. Evidente que houve um equívoco quando da opção pela modalidade tributária, que poderia ser instituída por intermédio de outro tributo não-vinculado, ou mesmo custeado através do orçamento obtido com as receitas de IPTU, ISS e demais verbas que abastecem o erário municipal. Em termos práticos, o contribuinte baririense que efetivamente pagou a integralidade do valor indicado no carnê do IPTU, que abrange a "Taxa de Proteção e Desastres", pode pleitear judicialmente (I) a restituição dos valores efetivamente pagos nos últimos cinco anos relativamente ao tributo indevido; e (II) o afastamento imediato das cobranças futuras ou, acaso estas sejam pagas durante o curso do processo, também sua restituição”, orienta.
Por fim, dr. Geraldo Barbieri Junior ainda frisa que o Supremo Tribunal Federal (STF) julga irregular a cobrança da taxa. “Importante frisar que essa matéria já é amplamente pacificada há muito tempo no âmbito do STF, precisamente pelo Tema 16, e a inércia da administração pública local em adotar as medidas necessárias à revogação da lei complementar municipal 123/17 custará caro ao erário, tanto com a restituição dos valores atualizados, quanto com os ônus de sucumbência processual, devendo ser assunto premente no debate público”, conclui o jurista.
STF derruba cobrança da “taxa de incêndio” em município gaúcho semelhante a Bariri
Em consulta ao portal do STF, nossa reportagem encontrou a seguinte matéria: “Supremo invalida normas que regulamentam cobrança de taxas de incêndio na cidade de Itaqui-RS”. Com 37 mil habitantes, a cidade gaúcha, assim como Bariri, também incluiu a “Taxa de Proteção e Desastres” no IPTU de seus contribuintes.
O texto publicado em 19 de março de 2024 alega que, os ministros do Supremo, em decisão unânime, “aplicaram diversos precedentes em que o STF afirmou a inconstitucionalidade desse tipo de cobrança voltada ao custeio de serviços vinculados à segurança pública”.
O relator da ação, ministro Flavio Dino, alegou que “ a jurisprudência do STF entende que é inconstitucional a cobrança de taxa na prestação de ações e serviços de segurança pública quando, devido a sua natureza, esses serviços devam ser prestados de forma geral e inteira à coletividade”.
De acordo com o ministro, esse é o caso dos serviços de prevenção e de extinção de incêndio, socorros públicos de emergência, desabamento, buscas de salvamentos e outros riscos que constam na norma questionada. Leia a matéria completa no Portal do STF através do link: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=529697&ori=1
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