Caso Latina: Giuliano Griso prometeu a Abelardinho “moer” empresário vítima de atentado; Ex-diretor de Obras arquiteta criação de perfil fake para atacar críticos da gestão Abelardo-Foloni nas redes sociais

Por Thaisa Moraes

m mais um capítulo do extenso Caso Latina, o promotor Nelson Aparecido Febraio Junior, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), anexou aos autos do processo um documento intitulado “Relatório de Eletrônico Apreendido”. Tratam-se de 47 páginas nas quais são exibidas mensagens trocadas entre o ex-diretor de Obras de Bariri, Giuliano Griso, e outros réus do processo da Latina Ambiental, comprovando a participação direta de Griso no esquema de fraude na licitação de limpeza pública, entre outros crimes.
Segundo o Ministério Público, as informações que compõe o relatório foram obtidas a partir da quebra de sigilo telemático do ex-diretor de Obras. O aparelho telefônico (Samsung Galaxy Note 10) que pertence a Griso foi apreendido por agentes de Gaeco em 08 de agosto de 2023, durante a megaoperação que deu origem à prisão de Paulo Ricardo Barboza, proprietário das Latina. Neste dia, foram cumpridos mandados de busca e apreensão em quatro endereços ligados a Giuliano Griso na cidade de Jaú, incluindo seu escritório de advocacia localizado na Rua Rangel Pestana, região central da cidade.
Griso recebeu e enviou áudios aos réus Paulo Ricardo Barboza (proprietário da Latina); Flávio Coletta (ex-chefe de Gabinete); Abílio Giacon Neto (vulgo “Gordo do Lixo”); Vagner Mateus Ferreira (o ex-vereador Vaguinho); além do prefeito cassado Abelardo Maurício Martins Simões Filho. 

“É importante notar que GIULIANO tentou ocultar inúmeras provas, com tentativas de excluir arquivos e conversas reveladoras de seu envolvimento na fraude licitatória. Contudo, foi possível comprovar pela análise do material analisado que ele estava, sim, envolvido na fraude. Foi, de fato, GIULIANO quem recebeu o material fraudado de FLÁVIO MUNIZ DELLA COLETTA que, por sua vez, recebeu de PAULO, e, articulado, ciente e organizado com os demais, deflagrou o pedido de licitação, prosseguindo em seus ulteriores termos com participação de todos os demais integrantes do esquema, em especial de ABÍLIO e PAULO RICARDO, que passavam constantemente todas as diretrizes para o curso do procedimento administrativo, com aval de ABELARDO. Foi possível identificar que GIULIANO e FLÁVIO, sob as ordens de ABELARDO, prosseguiam com a licitação de acordo com o determinado por Paulo”. – Dr. Nelson Aparecido Febraio Junior - Promotor de Justiça do Gaeco.

Confira a seguir as principais informações acrescentadas ao processo, com base no Relatório de Eletrônico Apreendido:
•    Dono da Latina exige que licitação de limpeza ocorra no formato “Pregão Presencial”
Em 22 de abril de 2021 (quatro meses após a chapa Abelardo-Foloni assumir o Executivo de Bariri), Paulo Ricardo Barboza, proprietário da Latina Ambiental, envia áudio ao então diretor de Obras, Giuliano Griso, falando que já havia combinado com Flávio Coletta (então chefe de Gabinete) que o pregão eletrônico da licitação de limpeza pública não deveria ser realizado na modalidade “Eletrônico”.
A investigação já havia revelado anteriormente a articulação dos réus para alterar o trabalho realizado no Setor das Licitações. Servidores de Carreira da pasta haviam definido que a licitação de limpeza deveria ocorrer na modalidade “Pregão Eletrônico”, fator que permite a ampla concorrência no certame, visto que, como o procedimento é online, mais empresas podem participar. No entanto, o ex-prefeito Abelardinho exigiu que a licitação de limpeza fosse realizada na modalidade “Pregão Presencial”, fator que restringe a concorrência; neste formato, empresas devem enviar à Prefeitura de Bariri representantes no dia e hora estipulados pela administração.

“O Giu. Boa tarde. O Flávio inicialmente me mandou o processo em pregão eletrônico, né? Formato. Daí nós conversamos sobre a, né? Nós já sabemos da necessidade de ser presidencial. Daí ele falou, estou devolvendo, pedindo pra reencaminhar porque eu pontuei algumas coisas lá nas quantidades e tal. Ele me ligou agora e falou para me alinhar com você, porque daí quando você mandar para ele, já está pronto para publicar. Então quando você tiver com isso aí com esse escopo pronto, manda pra mim só pra mim, dar um confere final. Te mando o positivo e você dá andamento. Daí eu afino com ele a publicação; quanto antes nós publicarmos, entendeu? Fico no seu aguardo. Muito obrigado.” – Paulo Ricardo em áudio enviado a Giuliano Griso.

•    Exigências da empresa, como redução do número de funcionários, geraram lucro à Latina e reclamações do serviço prestado
Em 23 de abril de 2021, Paulo diz a Griso que os termos do edital da licitação de limpeza precisariam ser elaborados prevendo um número mínimo de funcionários. Quanto menor o número de trabalhadores, maior seria o lucro da Latina na licitação. 
Mais tarde, a redução do número de funcionários se transformou numa grande “dor de cabeça” à Latina e à gestão Abelardo-Foloni: sem a força de trabalho necessária, as falhas no serviço público se tornaram perceptíveis, gerando críticas pesadas manifestadas pela população baririense, vereadores e imprensa. 

“Giu, bom dia, tudo bem? O pessoal aí da prefeitura tá muito atrelado na nas antigas práticas, na, na metodologia antiga de trabalho. Isso aí, em nenhum lugar mais funciona dessa forma, entende? Eu vou explicar pra você. Veja, ao passo que você tem um contrato onde você exige, sei lá, 30, 40, 50 pessoas, que seja. Vai chegar no final do mês e, ao imaginar uma situação onde você não me solicitou nenhum serviço nesse mês, você vai ter que me pagar porque você tem 50 funcionários hipotéticos lá, entende? Agora se você tem, se você solicita serviço de 22 Campos de futebol nesse mês, não interessa quantos funcionários eu vou ter que por lá. Eu vou ter que fazer os 22 Campos de futebol e você vai ter que me pagar pelos 22 Campos de futebol que você solicitou, correto? Como hoje o atual contrato é de 50 pessoas, você vai ter que me pagar independente de eu produzir ou não. Percebe a contradição na situação? Então, a metodologia de cobrança é a mais correta? Você só paga o que foi executado. Agora, se você coloca no contrato exigências a nível de números de funcionários, você basicamente está mantendo o que tá hoje. Vocês estão pagando pro cara, mas eu duvido que o cara execute 10% da necessidade real da prefeitura.” – Paulo Ricardo em áudio enviado a Giuliano Griso.

•    Griso diz a Abelardinho para colocar Abílio Giacon Neto na licitação do transbordo de lixo 
Em áudio enviado a Abelardinho, Giuliano Griso fala ao ex-prefeito sobre a necessidade de incluir o empresário Abílio Giacon Neto no contrato do transbordo de lixo. Abílio já possuía contrato com a prefeitura pra o serviço de coleta de lixo (serviço que sua empresa, a Mazo & Giacon) presta até o presente momento.
A investigação do Ministério Público já havia revelado a tentativa de fraude na licitação do Transbordo do Lixo. A ideia era que um empresário da cidade de Bocaina vencesse o certame, mas o plano falhou após uma empresa de Bariri, que concorreu no pregão, apresentar recurso na Justiça e obter decisão favorável após um mandado de segurança contra a Prefeitura de Bariri. A licitação de transbordo está sendo investigada em separado pela promotoria.
No áudio, Griso cita a diretora de Finanças (Natália Sisto); Abílio Giacon Neto (referenciado como apenas “Neto”); e uma terceira pessoa chamada de “Junior”. 

“Sim, Abelardinho, vamos pedir sim. Só que eu preciso saber se dá pra contratar, né? Igual eu te falei, a Natália não me passou ainda o valor que eu tenho pra dispor. Uma das coisas que a gente tem que contratar é o novo transbordo, o novo transporte lá com a estre, colocar o Neto na parada. Fazer o novo tapa buraco que o Junior tá precisando.” – Giuliano Griso em áudio enviado a Abelardinho.

•    Griso alerta Abelardinho sobre ausência do serviço de varrição na licitação de limpeza
Ao analisar o edital da limpeza pública, Giuliano Griso comunica Abelardinho que, entre os itens previstos no contrato direcionado exclusivamente para a Latina, não existe o serviço de varrição de rua. 
Mais tarde, a investigação revelou que a Latina também pretendia fraudar em Bariri uma nova licitação, voltada exclusivamente para a varrição. Os planos do novo contrato, no entanto, foram atrasados, pois na oportunidade, os problemas na limpeza pública estavam chamando a atenção negativamente para empresa. 

“Tudo bom, Prefeito? Tarde. Eu estava dando uma dando uma analisada na licitação da limpeza pública, naquele edital que o rapaz mandou lá. Não tem varrição, tá? Nós já soltamos ele e eu tava conferindo aqui, não tem varrição, hein! Isso é um problema.” – Giuliano Griso em áudio enviado a Abelardinho.

•    Plano de vingança contra empresário vítima de atentado criminoso 
No dia 02 de junho de 2023, o empresário baririense Fábio Yang, sofreu atentado criminoso em sua própria casa, após ser ameaçado de morte e roubado por um policial militar encapuzado e armado, identificado como Alexandre Gonçalves. Ele foi contratado por Paulo Ricardo Barboza, dono da Latina, para o crime. 
Paulo Ricardo revelou que realizou a ação após ser pressionado pelo ex-prefeito de Bariri, Abelardinho, para “dar um jeito em Fábio”, em represália à uma série de denúncias publicadas pelo Jornal Noticiantes que revelaram irregularidades na licitação de limpeza pública. 
Exatamente dois anos e quatro meses antes do atentado criminoso, Abelardinho e Griso já demonstravam incômodo contra Fábio Yang: em 02 de fevereiro de 2021, Griso envia áudio ao ex-prefeito prometendo “moer” a vítima, após se reunir com uma terceira pessoa (que teve seu nome ocultado na peça do MP). 
Segundo apurado por nossa reportagem de maneira extraoficial, Giuliano Griso teria pedido a pessoas ligadas à imprensa local, incluírem na programação diária, comentários que tinham por objetivo de descredibilizar e ministrar ataques xenofóbicos contra a vítima (Fábio Yang). 
O fato de Griso e Abelardinho arquitetarem vingança contra a vítima ratifica o discurso de Paulo Ricardo Barboza, que acusa o ex-prefeito de Bariri de ser o mandante do crime. Abelardinho, no entanto, nega as acusações.

“Bom, prefeito; é o seguinte (...). E ele vai começar a pegar no pé do china, tá? Do Yang. O Yang tá enchendo o saco (...) ele vai pra guerra com China. O China tá fodido com ele, cara. Eles vão para cima do China e de tudo quanto é jeito que você imaginar, tá? Pediu pra eu te avisar, para você não se assustar, mas ele vai moer o China. Tá bom? Por favor, entre nós só tá um abraço.” – Giuliano Griso em áudio enviado a Abelardinho.

•    Griso arma para atrapalhar liberação de empreendimento imobiliário de vítima 
Uma das maiores críticas direcionadas ao ex-diretor de Obras de Bariri, Giuliano Griso, era o fato dele ocupar a pasta sem qualificação necessária: Advogado de formação, Griso não possui graduação em engenharia, fator que o impedia de assinar termos relacionados a obras públicas entre outros documentos que passavam pelo setor.
Em 20 de outubro de 2021, Griso envia mensagem de áudio para uma terceira pessoa (não identificada pelo MP) pedindo ajuda para impedir a liberação de um empreendimento imobiliário da empresa da vítima do atentado criminoso, Fábio Yang. Novamente, o processo deixa claro que um diretor do alto escalão da administração Abelardinho tinha a intenção de prejudicar diretamente a vítima, que viria a sofrer atentado criminoso um ano e meio depois. 

“Viu, eu precisava falar com o senhor. Vamos parar um pouco com esse mimimi nosso aí, encrenquinha de moça. Precisamos conversar coisa séria. Com relação ao Yang, os empreendimentos dele aqui. Tem alguns que eu vou ter que soltar e eu não gostaria de soltar. E eu precisava da sua ajuda aqui, com relação a isso. Vamos virar a página, ok, meu amigo? Um abraço.” – Giuliano Griso em áudio enviado à pessoa não identificada.

•    Convite para churrasco confirma relação próxima de Griso e outros membros da organização criminosa. 
Um homem não identificado pelo Ministério Público manda uma mensagem em áudio para Giuliano Griso o convidando para um churrasco. Além de Griso e do interlocutor desconhecido, a confraternização “entre amigos” iria contar também com a presença do ex-prefeito Abelardinho, do ex-vereador Vagner Mateus Ferreira e de Abílio Giacon Neto, empresário da coleta de lixo. 
Vaguinho virou réu e foi condenado a 11 anos de prisão por participação em fraude de licitação no “Caso das Barracas” (primeira fase da Operação Prenunciados); ele está preso há um ano e seis meses e cumpre pena no Centro de Ressocialização (CR) de Jaú. Assim como Griso e Abelardo, Abílio Giacon Neto virou réu no Caso Latina (segunda fase da Operação Prenunciados); ele está preso desde 14 de setembro de 2023 e cumpre pena no Centro de Detenção Provisória (CDP) de Bauru.

“Deixa eu falar. Vamos fazer um churrasco semana que vem eu, você, o Abílio, Vaguinho, Abelardo, a turma aí, mas pede um alvará um pouco maior pra sua mulher. Ela bate muito em você assim? Tu tá louco? O fazer um churrasquinho pelo menos até às 9:00h, né? Pede pra patroa aí e semana que vem a gente combina hein.” – Homem não identificado em áudio enviado a Griso.

•    Griso direciona contratação de paisagista através de fraude de orçamentos
Em áudio enviado em 21 de setembro de 2021 para uma mulher de nome “Daiane”, Giuliano Griso orienta que ela apresente três orçamentos antes de finalizar o processo de contratação. Segundo apurado por nossa reportagem, trata-se de uma paisagista terceirizada que prestou serviços para a Prefeitura Municipal de Bariri.
A promotoria conclui que, sob a orientação de Griso, a profissional “iria pegar os orçamentos dos supostos concorrentes para apresentar o seu em melhores condições para ser contratada”. 

“Bom dia, Daiane. Tudo bem? É preciso de 3 orçamentos. É com relação aqui a prefeitura, a praça da matriz e lá para cima do skate, lá na frente atrás tá? Me traz aí porque eu preciso fazer o termo de referência, por favor. Obrigado. Bom dia.” – Giuliano Griso em áudio enviado a mulher identificada como “Daiane”.

•    Perfis fake criados para atacar críticos da gestão Abelardo-Foloni nas redes sociais 

A investigação revela que Giuliano Griso orientou uma terceira pessoa (não identificada) a criar perfis fake para atacar desafetos da administração nas redes sociais. Após passar a ordem da criação do perfil fake a um terceiro, Griso recebe o seguinte áudio como resposta:

“A, eu vou mandar sim! Mas eu vou mandar com Facebook fake. Aquilo que você mandou pra mim ontem eu mandei direto no da página dele. Mas eu to descolando um perfil fake aÍ, que você vai ver só eu começar moer esses caras ai. Carma. Agora eu vou com tudo pra cima deles.” – Homem não identificado em áudio enviado a Griso.