Improbidade Administrativa: Abelardinho, Flávio Coletta, Giuliano Griso, Abílio Giacon e proprietário da Latina Ambiental são alvos de ação do MP

Improbidade Administrativa: Abelardinho, Flávio Coletta, Giuliano Griso, Abílio Giacon e proprietário da Latina Ambiental são alvos de ação do MP

O promotor Nelson Aparecido Febraio Junior, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), órgão do Ministério Público do Estado de São Paulo, ajuizou uma “Ação Civil Pública de Responsabilidade por Ato de Improbidade Administrativa e Lei Anticorrupção Empresarial”. Protocolada nesta quarta-feira (10), a petição de 109 páginas (versão resumida) revela detalhes exclusivos da extensa investigação sobre a organização criminosa formada na Prefeitura Municipal de Bariri, cujo objetivo principal era fraudar licitações e direcionar contratos públicos através de pagamento de propina entre os envolvidos.
Os alvos da ação são: Abelardo Maurício Martins Simões Filho (ex-prefeito de Bariri); Flávio Muniz Dalla Coletta (ex-chefe de gabinete e ex-diretor de Desenvolvimento); Giuliano Griso (ex-diretor de Obras e Meio Ambiente); Abílio Giacon Neto (empresário da Mazo & Giacon, vencedora da licitação de coleta de lixo); e Paulo Ricardo Barboza (proprietário da Latina Ambiental). 
A empresa Latina Ambiental Ltda. também é denunciada como pessoa jurídica. Destaque para o Município de Bariri, citado como “pessoa jurídica de direito público lesada”. O Ministério Público deixa claro que, nesta denúncia de improbidade, Abelardo, Flávio e Griso são considerados agentes públicos; já Paulo Ricardo e Abílio Giacon são “particulares que concorreram dolosamente para os atos”. Por fim, a empresa Latina Ambiental é definida como “pessoa jurídica constituída e utilizada unicamente para os fins de crimes contra administração pública”. 

 

Organização criminosa entre os envolvidos começou em 2020, após chapa Abelardo-Foloni cravar vitória nas eleições 

A apuração alega que a movimentação criminosa entre as partes foi iniciada já ao final de 2020, após os resultados das Eleições Municipais que consagraram vitória de Abelardo Simões e Fernando Foloni. Desde antes de assumir a cadeira, o ex-prefeito e deu início às tratativas entre pessoas que seriam aliados ao Executivo “para única finalidade de desvios de valores decorrentes de contratos públicos”. 
Neste sentido, as nomeações de Flávio Coletta (que primeiramente serviu como Chefe de Gabinete) e Giuliano Griso (à frente da Diretoria de Obras e Meio Ambiente), para ocuparem cargos de alto escalão na administração Abelardo-Foloni, já foram definidas, conforme concluiu o MP, com o intuito de criar uma rede de agentes públicos dispostos a encobertarem as fraudes licitatórias. 
Nos primórdios da administração Abelardo-Foloni, as funções atribuídas para Flávio e Griso realmente foram bastante questionadas. Flávio, por não ter qualquer tipo de experiência em carreira pública, entrando logo para chefiar o Gabinete do prefeito municipal, cargo de extrema importância; o chefe de gabinete costuma ser mais ativo, dentro da prefeitura, do que o vice-prefeito, por exemplo. Já Griso, além de ser morador de Jaú, não possui qualquer qualificação em engenharia ou áreas correlatas para ter chefiado a Diretoria de Obras – visto que é advogado de formação e não tinha sequer autorização para assinar os projetos de sua própria pasta. 
O empresário Abílio Giacon Neto possui fortes laços de amizades com o ex-prefeito Abelardo Simões, que o chamava pelo apelido de “Gordo”, alega a promotoria. Abílio é sócio proprietário da Mazo & Giacon, empresa vencedora da licitação e coleta de lixo no município. Por conta de desdobramentos desta mesma investigação, ele está preso há sete meses. “Abílio Giacon passou a ser encarregado pela estruturação de um núcleo organizado para desvios de valores públicos no ramo da limpeza pública municipal, além de outros indicados na investigação”, diz a ação.

 

Funções dos denunciados no esquema criminoso

 

Latina chega em Bariri já no primeiro mês de mandato de Abelardinho

Quando Abelardinho assumiu a prefeitura em janeiro de 2021, a empresa Maria Aparecida de Souza Nossa-EPP, detinha o contrato de limpeza pública na cidade, por aproximadamente R$ 139 mil mensais. Para isto, a empresa utilizava 45 funcionários, equipamentos e maquinário.
“Contudo, a fim de angariarem interesses próprios e escusos, favorecendo a empresa que já haviam arquitetado que seria a nova contratada, qual seja Latina Ambiental, os agentes públicos envolvidos, agindo sob uma falsa aparência de licitude, encerraram contrato com a empresa até então contratada”, alega a promotoria.
Para executar a manobra, o então diretor de Obras, Giuliano Griso, passou a emitir notificações contra a empresa e apontar irregularidades inexistentes na prestação do serviço. Ao mesmo tempo, as negociações com Paulo Ricardo Barboza e a Latina Ambiental já estavam em andamento. 
E janeiro de 2021, foi realizada a primeira reunião em Bariri para tratar sobre o direcionamento do contrato de limpeza pública. Participaram do encontro Paulo Ricardo, Abílio Giacon, Flávio Coletta, Vagner Matheus Ferreira, além do prefeito Abelardo. Em depoimento, Vaguinho confirmou que realmente houve a reunião, assim com a presença física de todos os citados. Isso significa que, desde o primeiro mês, a gestão Abelardinho já estreitava relações com Paulo Ricardo Barboza. Na agenda do dono da Latina Ambiental, foi encontrada uma anotação datada de 21 de janeiro de 2021, data da reunião no Paço Municipal de Bariri. 

 

Bariri copia manobra aplicada em Santa Gertrudes

Em março, o diretor de Obras, Giuliano Griso, solicitou abertura de licitação para limpeza pública por meio de ofício. Com isso, o termo de referência da licitação foi lançado – documento este que seguiu os mesmos parâmetros da licitação e limpeza pública celebrada no município de Santa Gertrudes, onde a Latina também detinha o certame. 
O MP chama a atenção para o documento de Bariri repetir, inclusive, os mesmos erros ortográficos do documento de Santa Gertrudes.  Nos autos do processo, é revelada uma troca de mensagens entre Paulo Ricardo e Rogério Pascon, ex-prefeito de Santa Gertrudes. No diálogo, o dono da Latina fala ao prefeito que “pegou mais uma cidade”, se referindo a Bariri. O diálogo continua com a negociação entre Paulo Ricardo e Rogério, sobre os valores desviados do contrato vigente em Santa Gertrudes. 
Na fase de orçamentos, além da Latina Ambiental, outras duas empresas que seriam concorrentes da Latina no certame, também apresentaram orçamentos com valores superiores ao da Latina. Uma das concorrentes foi a Mazo & Giacon, cujo sócio proprietário é Abílio Giacon Neto.
No dia do Pregão Presencial, a Latina foi a única empresa participante e, portanto, se sagrou vencedora da licitação. 

“Na execução contratual, passaram a autorizar que a Latina Ambiental fizesse uso de maquinários, caminhões, combustíveis e servidores do Município para realizar o serviço, ou seja, o Poder Executivo passou a pagar para Latina Ambiental por serviços que eram realizados pelos servidores municipais e com equipamentos municipais, tudo para gerar lucros para empresa, diminuindo seus gatos. Além disso, inúmeros serviços não foram prestados e, mesmo assim, pagos, com prejuízos contabilizados ao erário”.

 

Licitação para “varrição de rua” beneficiaria Latina Ambiental

Os denunciados estavam se articulando para incluir a prestação de um outro serviço que beneficiaria diretamente a empresa Latina Ambiental. Os trâmites para abertura de um novo certame, de “varrição de vias públicas” já estavam em andamento, seguindo o mesmo direcionamento utilizado na licitação de limpeza pública. 

“Abelardo, Paulo e outras pessoas estavam articuladas para juntos, fraudarem licitações, majorar o contrato de Paulo com a administração de Bariri, com inserção de novo serviço (inclusive varrição) no contrato e valor exorbitantemente superior”.

Os planos para este novo serviço, no entanto, foram adiados, uma vez que, nesta época, as irregularidades da Latina já chamavam a atenção da imprensa, Câmara Municipal e Ministério Público. Uma troca de mensagens entre Paulo Ricardo Barboza e sua esposa Cassiana, mostra o proprietário da Latina dizendo que Abelardinho estaria com “medo” e pediu para “segurar” a nova fraude.

“Ele dá uma engavetada, por hora, até passar as coisas que tá acontecendo lá no MP e tal e depois soltar”, diz Paulo Ricardo sobre conversa que teve com Abelardo à respeito da varrição de rua. 

 

Abelardo invoca “direito de silêncio” e não comparece a depoimento

Convocado para prestar esclarecimento ao Ministério Público, Abelardo Simões invocou o chamado “direito de silêncio”, ato previsto na Constituição. Com isso, o ex-prefeito se negou a responder as perguntas que seriam formuladas pela promotoria. 
Em documento datado de 21 de fevereiro de 2024, Abelardinho “solicita a dispensa de seu comparecimento” e, por orientação da defesa, alega que “permanecerá em silêncio”.
Com a recusa de Abelardo, a promotoria seleciona trechos chaves do depoimento do ex-prefeito durante a Comissão Processante que culminou em sua cassação. Nas oitavas da CP, ele mente ao negar que realizou reuniões com Paulo Ricardo Barboza, entre outras blasfêmias comprovadas perante a investigação. 

“Em análise detida das provas, foi possível constatar as mentiras de Abelardo, que disse em declarações públicas que sequer tinha visto Paulo Ricardo. E ao contrário do que ele tentou explicar na ocasião, seu envolvimento vai muito mais além do que uma dedicatória em livro”.

 

Chefe de gabinete e ex-diretor de Obras também são citados nos autos 

Chama a atenção ainda o fato da atual chefe de Gabinete de Fernando Foloni, Maria Luiza Rodrigues, e do ex-diretor de Obras, Márcio Nascimento, também serem mencionados na ação. Segundo o MP, assim como os denunciados Flavio e Griso, Luiza e Márcio também participavam de reuniões com o representante da Latina Ambiental.

“Abelardo era, sim, aliado de Paulo e Latina. Favorecia os interesses de empresário privado para fazer jus à remuneração mensal. E para tanto, valia-se de seus diretores (Flávio, Giuliano, Márcio e Luiza) e amigos próximos, que também participavam os conluios fraudulentos”.

 

Atuação de servidor do Meio Ambiente contra licitação fraudulenta ganha destaque

Sincler Aparecido Policarpo, servidor de carreira responsável, pelo Setor de Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Bariri, foi o gestor do contrato da Latina Ambiental em um curto período de tempo. Na oportunidade, o servidor, ao contrário dos cargos de confiança de Abelardinho, apontou inúmeras irregularidades no contrato da limpeza pública, chamando a atenção do prefeito e sua equipe para as fraudes e serviços não prestados pela empresa
A atuação de Sincler, que trabalhou para expor as mazelas da Latina Ambiental às custas do Poder Público baririense, foi destacada pela promotoria. Por causar “incômodo” a Paulo Ricardo Barboza, ele acabou retirado do contrato, após o dono da Latina Ambiental pedir a ajuda de Abelardinho e Márcio Nascimento.

“Sincler foi a pessoa que identificou inúmeras falhas e serviços que não estavam sendo prestados, embora os pagamentos estivessem sendo realizados. Após tais entraves, Paulo combina com Abelardo e Márcio Nascimento que iriam providenciar a saída de Sincler do contrato para que não mais ocorre a fiscalização”, diz o MP.
Em um áudio de Paulo Ricardo Barboza enviado ao gerente da Latina, mostra seu incômodo com Sincler ao afirmar: “conversei com Márcio e Abelardo e eles vão tirar a portaria do Sincler (...). Então o Sincler até sexta-feira vai sair da nossa bota”.

 

Improbidade administrativa

Pode-se definir a improbidade administrativa como sendo ato ilegal ou contrário aos princípios básicos da Administração Pública, cometido por agente público, durante o exercício de função pública. Quem, mesmo não sendo agente público, participe ou se beneficie da prática de ato de improbidade, também está sujeito às penalidades previstas na lei.
A Lei 8429/92 estabelece três espécies de atos de improbidade: I- os que importam enriquecimento ilícito (art. 9º); II- os que causam lesão ao patrimônio público (art. 10); e III - os que atentam contra os princípios da Administração Pública. 
O Ministério Público pede que os investigados (Abelardo, Flávio, Griso, Abílio e Paulo Ricardo) sejam condenados por “atos de improbidade administrativa e corrupção empresarial imputados, com as penas correspondentes”. A promotoria também cita enriquecimento ilícito que beneficiou as partes e lesou diretamente o município de Bariri. 

“Abelardo deixou de lado qualquer moralidade mínima que se espera de um Prefeito Municipal, tratando assuntos criminosos com empresário que já havia fraudado, com seu consentimento e atuação ativa, licitação e contrato na cidade de Bariri e estava, uma vez mais, atuando conjuntamente com o mesmo empresário para novas fraudes”, concluiu dr. Nelson Aparecido Febraio Junior.