Carta ao Artur

Carta ao Artur

“Gostei muito da ‘releitura’ que você fez das minhas crônicas. O fato de alguns textos, escritos despretensiosamente, terem despertado a atenção de um jovem de apenas 16 anos é muito gratificante e motivo de grande orgulho para mim. Fico mais feliz ainda porque você é um predestinado. A começar pelo seu nome: Artur, lendário líder britânico que comandou a defesa da Grã-Bretanha contra os invasores saxões. O seu pai, meu amigo, também não deixa por menos. Ele não liderou os britânicos nem foi rei da Macedônia, mas é Alexandre, o Grande. Grande na generosidade e nas artes de fazer amigos e ser útil ao próximo. Além de tudo que foi dito, você ainda tem mais um trunfo nas mãos: o seu avô é divino - Divino Vantim, ex-prefeito de Alvinlândia e figura muito estimada naquela região. Não é preciso ter uma bola de cristal para saber que o seu futuro será brilhante. Ao que foi dito, somem-se sua inteligência, responsabilidade e seu grande interesse pelos estudos e pela nossa língua - pobre língua portuguesa, massacrada e vilipendiada diuturnamente, inclusive por aqueles que têm a obrigação de não errar. Refiro-me à imprensa. Ao contrário do que acontecia no passado, hoje em dia tenho visto muita gente “pisar na bola”. Não sei se os jornalistas se tornaram menos atentos ou eu fiquei menos ignorante. Muita gente acredita naquela história de que “o Brasil foi descoberto graças a um erro de português” - aquela versão de que Cabral ia para as Índias, errou o caminho e veio parar no Brasil. Assim, quem comete erros de português pode até descobrir novos Brasis e sair no lucro, mas isso é raro. 
Cito algumas preciosidades. Um erro tão comum quanto grosseiro é afirmar que tal fato ocorreu na “zona rural da cidade”. Mas a cidade não tem zona rural. O município é que tem zona urbana (a cidade) e rural (fazendas, sítios, etc.). Outro erro lamentável cometeu um jornal da região ao noticiar fato ocorrido na nossa querida Ubirajara, há muitos anos. O autor da reportagem escreveu: “O cadáver foi morto com dois tiros”. Se era cadáver, já estava morto - e mesmo assim morreu de novo! Deveria ir para o Guiness, o livro dos recordes, com o seguinte texto: “Brasileiro morre duas vezes sem nunca ter ressuscitado. É o cúmulo do azar”. 
Não sou exigente. Até acho compreensível que algumas pessoas, por falta de cultura, cometam erros. Estranhei, mas não fiquei espantado quando um amigo, morador da zona rural “do município”, contou, eufórico: ‘Outro dia passei no ‘retrateiro’ e tirei um retrato”. A conversa prosseguiu e apareceu mais uma preciosidade: “Eu não estava ‘bom’, fui à farmácia e falei com o farmagista”! Mas era pessoa sem cultura. Agora, triste mesmo é querer bancar o sabidão. Há mais de 30 anos, em Bauru, algo me deixou com os cabelos em pé - naqueles tempos eu os tinha em profusão. Na sessão de guloseimas de um supermercado, ao lado de uma grande vasilha transparente, de vidro, abarrotada de doce pastoso amarelado, puseram um cartaz que poderia ser interpretado como convite ou advertência, com os seguintes dizeres: “Experimente nosso delicioso doce de abóbora com cocô!” O supermercado não foi multado, mas ninguém teve coragem de experimentar o tal doce...” 

Nota - Artur Vantim Elias da Silva é filho do casal Alexandre Elias da Silva e Janaína. Tem 16 anos e mora em Marília, onde cursa o nono ano do Ensino Fundamental.