Vereadores acionam MP após Clélia propor aumento salarial expressivo para diretores e outras categorias; proposta que favorece familiares da prefeita gera revolta e manifestação popular na Câmara de Itapuí

Vereadores acionam MP após Clélia propor aumento salarial expressivo para diretores e outras categorias; proposta que favorece familiares da prefeita gera revolta e manifestação popular na Câmara de Itapuí

“Prezado cidadão, esta mensagem é especialmente para você, que talvez ainda não tenha conhecimento das decisões que estão sendo tomadas pela prefeita Clélia. Na próxima segunda-feira, dia 14/04/2025, a Câmara Municipal votará projetos que, no mínimo, levantam sérias questões morais. Seria interessante que você comparecesse e acompanhasse de perto como o seu vereador se posiciona diante de tamanha vergonha disfarçada de benefício.”  – Trecho da mensagem de autoria anônima disparada massivamente nas redes sociais de Itapuí.

 

Uma população inflamada lotou o plenário da Câmara Municipal de Itapuí na noite desta segunda-feira (13). Com todos os assentos ocupados e pessoas em pé, ocupando os corredores – algo raro de se ver no Legislativo do município de 15 mil habitantes – a população compareceu em peso na sessão e pressionou os nove vereadores, que não esconderam a tensão e o nervosismo estampados em seus rostos.
O motivo que causou a manifestação popular tem nome e sobrenome: Maria Clélia Viaro Pichelli (PSD), Prefeita Municipal de Itapuí.

Tudo começou ao final da última semana, quando Clélia enviou ao Legislativo quatro projetos de lei que alteram remunerações de diversos cargos e funções públicas, incluindo salários dos diretores do alto escalão, que atualmente recebem R$ 8,3 mil por mês. 
As referidas matérias são:

•    Projeto de Lei Complementar nº. 7: Neste projeto, 34 cargos públicos, desde jardineiro até psicólogo, têm os salários alterados. No entanto, chama a atenção a alteração salarial do cargo “Fiscal de Obras e Posturas”, ocupado pelo primeiro-cavalheiro de Itapuí, Richard Willian Pichelli, marido da prefeita Clélia, cujo salário (bruto) atual é de R$ 4.830,23, conforme consta no Portal de Transparência. 
Com a alteração proposta pela prefeita, Richard passaria a receber mensalmente o valor de R$ 8.227,08 (com progressão salarial prevista na tabela de vencimentos de até R$ 11.056,51).
Também chama a atenção a alteração salarial do cargo “Fiscal de Tributos”. Entre os quatro fiscais de tributos que atualmente ocupam a função na Prefeitura de Itapuí, está Paulo Sergio Pichelli, cunhado da prefeita Clélia. Conforme o Portal de Transparência, o salário atual (bruto) de Paulo Sergio é de R$ 5.773,28. Com a alteração proposta pela prefeita, Paulo Sergio passaria a receber mensalmente o valor de R$ 8.227,08 (com progressão salarial prevista na tabela de vencimentos de até R$ 11.056,51). 
Por fim, além dos 34 cargos públicos, o mesmo projeto impõe alteração salarial aos diretores para R$ 11.700,00 – um aumento de R$ 3.400,00. Atualmente, a Prefeitura Municipal de Itapuí tem 12 diretorias: Desenvolvimento Social (Aline Spuri); Transportes (Diego Muller Amado); Finanças (Evandro Duche); Administração (Jonatan da Costa); Esporte e Lazer (Leonardo do Espírito Santo); Obras e Serviços Urbanos (Luiz Pierazzo); Cultura e Turismo (Marcelo Furlen); Saúde (Mariana Lanza); Patrimônio e Multiserviços (Mariana Yumi); Educação (Renata Oliveira); Agricultura Meio Ambiente (Sebastião Fonseca Junior); e  Planejamento (Silas Oliveira).

•    Projeto de Lei Complementar nº. 9 - Diz que a Procuradoria Geral do município passará a ser dirigida por um Procurador-Geral de livre nomeação (cargo de confiança), com salário no valor de R$ 13.188,76. Até o presente momento, o advogado que assume o cargo de procurador geral passa por concurso público. Caso a mudança seja aprovada, Clélia nomeará um advogado de sua confiança para assumir a função.

•    Projeto de Lei Complementar nº. 10 - Altera a gratificação das atividades de ouvidor e corregedor, além de criar mais 5 funções gratificadas.

•    Projeto de Lei Complementar nº. 11 - Altera o salário do cargo de médico veterinário para R$ 7.500,00. Entre os quatro médicos veterinários que atualmente ocupam a função na Prefeitura de Itapuí, está o vereador Matheus da Costa Aranha, que recebe mensalmente o salário (bruto) de R$ 4.316,88.

Cavera pede ordem mas é ignorado por manifestantes


Durante a deliberação dos projetos de lei, a população presente na sessão reagiu às falas dos vereadores Juliano Maia (MDB) e Rita Xavier (PL), com aplausos e gritos de incentivo. Não é permitida a manifestação verbal do público no plenário Legislativo durante sessões ordinárias. 
O Presidente da Câmara, Valdir Castanho, o Cavera (PSD), tentou conter os protestos verbais do público por pelo menos duas vezes, chamando a atenção ao microfone, mas nem mesmo a ameaça de colocar pessoas para fora do plenário adiantou. Ninguém conseguiu calar a população itapuiense. 

“Impacto financeiro somente para aumento dos diretores é de R$ 2 milhões” diz Juliano Maia

Utilizando a Tribuna, Juliano Maia expôs que, diante da repercussão negativa causada pelos projetos, houve uma sutil mudança de posicionamento no grupo de vereadores da base da prefeita Clélia. 
Segundo ele, ocorreu uma reunião interna antes do pleito, ocasião em que fora decidido que os projetos não iriam mais entrar em ordem de urgência, como teria sido a intenção inicial. Juliano ainda sugeriu que o projeto seja fragmentado, ou seja, um projeto de lei de restruturação salarial apenas para os servidores concursados, e outro apenas para os diretores e cargos de confiança. 

“Em relação aos diretores, isso tem que ser muito bem estruturado. São só quatro meses de trabalho e temos que parar para pensar. O impacto financeiro somente de diretores, se aproxima de R$ 2 milhões. Com R$ 2 milhões, o que podemos fazer pela cidade? Chega de falar de herança de gestão passada! Estamos aqui para mostrar serviço. O que a gestão passada fez, acabou! Tem novos vereadores e uma nova gestora, entre aspas, para arrumar o que está errado. Tem vários funcionários que estão fora do piso. Esse projeto é voltado para uma monarquia. Isso é baseado em muitos favorecimentos. Peço às comissões que sejam justos. Olhem para cada funcionário que está lá. Digam para esses funcionários que um diretor merece R$ 3,5 mil de aumento e que um servidor merece apenas R$ 100,00. Separe esse projeto e vamos ser dignos. Cargo comissionado é uma coisa; cargo público é outro. Temos que respeitar as leis; temos que respeitar os cargos. Que as comissões separem esses projetos e que sejam dignos com todos os funcionários”.


Na deliberação do Projeto de Lei Complementar nº. 9,  que pede nomeação livre para o cargo de Procurador Jurídico (até então concursado), Juliano também questionou qual seria a motivação da prefeita em trocar um cargo concursado por um cargo comissionado. Atualmente, a Prefeitura de Itapuí conta com duas procuradoras concursadas: dra. Alessandra Bardelini e dra. Katucha Sgavioli.

“Uma nomeação livre nem sempre é adequada. Se a prefeita não está feliz com as procuradoras, ela quer o que? Um auditor? Não vejo com bons olhos essa contratação. Se precisa, que abra um concurso então. Assim, o município terá uma pessoa qualificada. É um cargo de R$ 13 mil, praticamente meio milhão jogado fora em quatro anos. Dinheiro público não é brincadeira”, alertou.

 

“Futuramente, a prefeitura vai ter dinheiro para pagar tudo isso?”, questiona Rita Xavier

Rita Xavier fez coro ao discurso de Juliano e também mostrou preocupação com o impacto orçamentário gerado pelo aumento expressivo que contempla mais categorias “X” do que categorias “Y”.

“Quero me manifestar como funcionária pública. É inadmissível aceitarmos um projeto desse. Enquanto uns vão ganhar de R$ 100 a no máximo R$ 500,00, outros vão ganhar quase R$ 5 mil a mais. Muitas vezes, a pessoa que vai ganhar esse aumento, não é digna. Não pode ser um peso e duas medidas. Gostaria que fosse para as comissões e que cada vereador fizesse as emendas. Tem que ser visto o impacto orçamentário. Futuramente, a prefeitura vai ter dinheiro para pagar tudo isso? Esse projeto só pode ser retirado das comissões quando estiver com a redação correta. Que seja justo para todos, um peso e uma medida para todos”, concluiu a vereadora.

 

Cadê o parecer jurídico?

No momento da Palavra Livre e explicações pessoais, Juliano Maia novamente fez o uso da tribuna revelando que a redação da matéria não teria passado pela Procuradoria do Município e, portanto, foi enviada ao Legislativo sem parecer jurídico. Ele ainda confirmou que a oposição acionou o Ministério Público contra Clélia.

“Fomos ao Ministério Público e conversamos com o promotor. Ele disse para nos resguardarmos sempre através do parecer jurídico. Fomos até a prefeitura e parece que não houve parecer jurídico. Os projetos foram enviados para cá sem passar pelo corpo jurídico da prefeitura. Isso é um caso grave. Gostaria que as comissões e que os vereadores tomassem providências. O Jurídico é muito bem pago para redigir os projetos e fazer o parecer. Alguns projetos que vieram hoje são muitos complicados para votar, ainda mais sem o parecer jurídico”, salientou o nobre.

 

MP acata denúncia

Na sequência, Rita Xavier disse que o Promotor de Justiça aceitou a denúncia que os vereadores fizeram, junto ao Ministério Público, à respeito dos projetos.

“O promotor aceitou a nossa denúncia e estamos levando a documentação para ele. Inclusive, gostaria que fossem colocadas as funções que não estão fazendo parte desse projeto – os cargos que ficaram de fora, como os professores, engenheiros e nutricionistas. Tosos merecem! Que seja visto a porcentagem de aumento igual para todos. Acredito que o promotor vai estar orientando a gente, inclusive as comissões, para que todos façam a coisa certa”, disse Rita.

 

Gabi da Saúde e Carlinhos Areas criticam oposição e sinalizam apoio às propostas de Clélia

Também na Palavra Livre, a vereadora Gabriela Dalossi (Podemos), lendo um texto pronto, criticou o posicionamento dos vereadores da oposição, dizendo que “o projeto representa avanço para a cidade”, e que “alguns preferem distorcer os fatos e transformar tudo em confusão”, classificando a oposição à gestão Clélia-Mecha como “desesperada”.


“Quando falta leitura e técnica sobra vontade de aparecer”, disse Gabi sobre a oposição. Na Câmara, a oposição ao atual governo é formada por Juliano Maia, Rita Xavier e Rafael Ficcio.
Carlinhos Areas (PSD) insistiu na oratória muito usada por Clélia: criticar os atos do governo anterior (mesmo a atual prefeita tendo feito parte do Executivo como vice durante 8 anos seguidos).

Carlinhos disse que, caso seja necessário, pode-se tirar o vale-alimentação dos diretores que não são concursados. 

 

Projetos seguem para análise de comissão

Por unanimidade, os polêmicos projetos seguem agora para análise e deliberação da Comissão de Constituição, Justiça, Cidadania, Obras, Melhoramentos Públicos, Finanças e Orçamento da Câmara Municipal de Itapuí. 
Os vereadores que fazem parte da comissão manifestam parecer contrário ou favorável a cada uma das matérias. Somente depois de passar pela comissão, caso haja parecer positivo, os projetos serão colocados para votação em sessão ordinária.
Confira abaixo como está composta a referida comissão na Câmara Municipal de Itapuí: